quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Lobivar de Matos: "5 Poemas"

O HOMEM E A FELICIDADE

O homem era uma flor no jardim do céu...
Numa tarde bonita, de um sol bonito,
uma mulher divina, chamada Felicidade,
passeando no sossego e na calma do jardim celeste,
encontrou-a, a sorrir,
feliz entre as outras flores da roseira,
encantada,
brincando, disfarçada,
levou as suas mãos macias, veludosas,
para a furtar...

Mas, que infelicidade! O jardineiro,
um velho de cabelos brancos, o Destino,
assistiu a cena do roubo...
E a Felicidade, coitada, toda nervosa
e sem graça, com um sorriso frouxo nos lábios
deixou que a flor caísse no chão...

É por isso que a Felicidade vive presa lá no céu
e que o homem anda rolando aqui na terra...



CATIVO
A uma mulher que já passou...

Maria –
sorriso do meu sonho!
Foi numa tarde fosca de janeiro
que te conheci...
quando passavas
assim
toda grácil
e heril
como um sonho, uma ilusão,
nesse poema inteiro do meu coração.

Maria –
lágrima da minha vida!
Foi numa sala modesta
cheia de riso e de festa
que nem olhaste indiferente
no meio daquela gente...
Nos teus olhos redondos e pretinhos
pude ver quando me viste,
um caminho de rosas e de espinhos...

Maria –
mistério do meu amor!
Foi numa noite argêntea, de luar,
Que ouvi o teu falar...
A tua voz olímpica de santa,
ficou eternamente presa
dentro de minh’alma.

Maria... não te queria falar...
Mas, foi naquela tarde fosca de janeiro,
quando passaste ligeira,
toda vestida de branco,
com um sorriso nos lábios,
sem ressabios,
que eu te conheci...

e desde então,
Maria,
ficaste no meu coração!...



ELEVAÇÃO

O céu recamado em oiro diluído,
as nuvens flutuando na beleza das alvoradas,
as estrelas nas noites de luar,
o luar nas noites estreladas;
a Terra coberta de folhas e de pétalas,
as paisagens soberbas e tranqüilas,
as florestas selvagens e ondulantes;
as montanhas vestidas de verde,
os campos floridos, verdejantes,
os árvores ramadas;
tudo, tudo isso,
enche de alegria os meus olhos...

O sussurro leve do vento,
o gemido vago da noite,
o silvo da viração silente,
a melodia mágica dos ninhos;
os zumbidos das abelhas,
o ruído suave das asas,
a festa lírica do passaredo que canta,
o eco de um violino que chora, em surdina;
o murmúrio de um beijo dado em silêncio,
o abraço de duas almas que se encontram,
o múrmuro cascatear das fontes,
a exaltação de uma prece;
a sonoridade das águas que passam cantando,
a palavra carinhosa dos namorados,
a sinfonia estranha das ondas bravias do oceano;
tudo, tudo isso,
enche de ternura os meus ouvidos...

e você, criança loira,
enchendo de luz a minha vida,
enche de amor meu coração...



INCERTEZA

Que será que sinto?!... Que será que tenho?!...
Não sei explicar aos homens,
nem o que sinto... nem o que tenho!...
Ah! se eu pudesse...
Mas, não sei se os homens me compreendem,
nem se sentem o que estou sentindo
nesta alma que sonha, que sofre, e que padece!...

Nem sei se amor ou se ódio
esta calma serena, esta revolta funda,
que quando mais perto das feras me coloca,
quanto mais dos homens me separa.

Oh! Força invisível que me faz pensar
na incerteza de tudo... na incerteza de tudo...

Nem sei se é dor ou se prazer
este grito mudo, este riso amargo,
que quanto mais perto da Vida me coloca,
quanto mais da Vida me separa.

Oh! Força invisível que me faz sofrer
na incerteza de tudo... na incerteza de tudo...

Que será que tenho?!... Que será que sinto?!...



MATO GROSSO

Mato Grosso dos índios bororos
de arco na mão e coragem no peito!

Mato Grosso das paisagens antigas
e das matas vestidas de verde!

Dos bois pastando nas estradas
e dos bezerros berrando nos currais.

Das ovelhas beatas de papo crescido
e das mulatas barrigudas lavando roupa.

Das onças sonhando nas capoeiras
e dos caçadores roncando nos galpões.

Da rapadura gostosa de coco
e do milho tostado na cinza do fogo.

Dos vaqueiros gaúchos com o laço na mão
e dos buracos de tatu amedrontando os vaqueiros.

Do churrasco quente assado na fogueira
e da farofa guardada no sapicuá.

Mato Grosso de tudo isso é meu também.

Quando te lembro, meus olhos
ficam assim, como os teus campos,
no tempo das enchentes – cheinhos d’água!


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Fonte:
Revista da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras: n. 4 - junho de 2004.

Um comentário:

  1. Muito interessante este espaço,que permite a nós do Pantanal novos olhares sobre o "poeta desconhecido" Lobivar Matos.

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