quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Geraldo Ramon Pereira: "5 Poemas"

AO MEU AVÔ TITIO
(Para José Pereira da Rosa Filho)

Evoco em sonhos auras já vividas
Na vertigem das horas vesperais...
E vejo a imagem sã, com tantas vidas,
Do meu finado avô pelos currais...

Eu, no “ingênuo folgar”, e ele, nas lidas
__ Bolsa de sal ao ombro, e os animais,
Já mugindo, a tangê-lo com lambidas
Aos cochos, que hoje o não verão jamais!

Mas, se às vezes visito a tal fazenda,
De cada cocho vem saudade horrenda
E de cada saudade esta visão:

Em vez de cocho para o sal do gado,
Nele vejo o vovô “Titio” deitado,
Pelas reses velado __ em seu caixão!



MINHA VIOLA

Tua madeira já foi pinheiro um dia,
Onde o vento manhoso, em sons de ninho,
As cordas milenares já feria
Na cantiga eternal de um passarinho!

Têm-te as curvas do encanto e da magia
Da formosa cabocla em desalinho...
Dela tens a voz triste, em litania,
Também clamas a falta de um carinho!

Por isso, viola minha, se a saudade
Esta vida tapera em dor me invade
E a ausência dela rói-me desse jeito,

Há só um consolo, ó viola abençoada,
É abraçar-te qual fosses minha amada,
Te aconchegando assim contra meu peito!



PEREGRINO DO AMOR

Qual do deserto um nômade sedento
A buscar um oásis no destino,
Em cada sonho eu ia atrás de alento,
E em cada alento eis novo desatino.

No vão caminho as pedras do tormento
Só me sangrando os pés de peregrino...
Plasmei, então, em preces, meu intento,
Paz implorando ao peito inda menino!

Valeu a pena, oh! Céus, a persistência
De buscar qual um louco na existência
Quem fosse – um dia ao menos! – minha amada.

Um dia de amor me era o suficiente...
Mas eis que Deus, tão justo e tão clemente,
Fez-te, Amor, minha eterna namorada!



ADEUS A OTÁVIO GONÇALVES GOMES

Foste a vaga cantante de alegria,
O vento sibilante no capim...
Hoje o canto tão triste silencia
Porque a realidade quis assim.

Sei que em pranto deixaste a Academia,
Sobrevoando Rio Pardo até Coxim;
Do chão que amaste a alma despedia,
Na busca tão incerta do Sem-Fim.

Tão muda a reverência, muda a prece,
Tudo em silêncio te acenava adeus...
Mas, em meio ao silêncio, te estremece

Um cântico que eclode da ansiedade:
Eram seriemas te clamando a Deus
Em súplicas precoces de saudade!


  
MEU MONJOLO
(Música do autor, gravada por ele na 3ª faixa do seu CD “Cheiro de Chão”).

I
Este peito corroído
Pelos cupins da ansiedade
É um judiado pilão
Moendo ao meu coração
Fubá de felicidade...
É o monjolo do tempo
Me socando aqui por dentro
Na cadência da saudade!
Refrão
Ai, ai... Eu não me consolo,
Vendo apodrecer no chão
Sem bater no seu pilão
O meu saudoso monjolo!
I I
Evocando sua lida,
Monjolo, meu companheiro,
Sua canção ainda ouço
Nas águas do calaboço
E eu brincando no terreiro...
Sem pensar que aquilo tudo
Fosse um dia ficar mudo
E como ficou ligeiro!
Refrão ...
III
Oh! Deus, que calamidade,
Ao seu lado soterrada
Também jaz a bica d’água,
Só que agora jorra mágoa
No monjolo do meu ser...
Você, a bica e o pilão
É o que resta nesse chão
Onde desejo morrer!
Refrão ...
 IV
Mas você foi minha vida,
Por isso eu quero sonhando,
Ó monjolo, meu irmão,
Rever você na ilusão
De ser menino outra vez...
E com você recompor
Toda uma vida de amor
Que o progresso desfez!
Refrão ...

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Fonte:
Revista da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras: nº 4 - junho de 2004.

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