terça-feira, 24 de novembro de 2015

William Douglas dos Santos: "5 Poemas"

VESTIDO DE NÓS

O teu corpo é o paraíso onde,
é certo, passarei meus dias
e o princípio das noites,
o prenúncio das madrugadas.
Lutam em meu corpo
o desejo de tocar-te e a prudência
de evitar-te toda.
O amor procura mudar-se em carinhos,
a razão pondera o perigo
de não pararmos na devida hora,
nos devidos limites tão tênues
de teu corpo tão lindo.
Nele morarei meus sonhos,
completarei a palma de minhas mãos.
No teu corpo, descansarei,
no vale de teus seios.
Um dia findará o mundo,
sendo só possível tua presença,
o contato completo, obrigatório,
como teu carinho,
que retorna tão límpido
e claro em teus gestos.
E um dia,
eu, que tanto te desejo,
terei certeza de que és a última,
e nos vestiremos
do manto da nudez,
que encobrirá nossos corpos.
Enfim, nos conheceremos no todo,
e morrerão todos os desejos,
que nascerão de novo,
em nossos corpos de fogo,
imantados de nossos seres,
feitos um para o outro.



NENHUMA MULHER

Nenhuma mulher diz não.
Se, eventualmente o fizer,
terá querido dizer “ainda não”,
ou, se o açodamento tiver sido tanto,
terá dito que ainda não era a hora.
Mulheres são como plantas,
que não florescem num instante,
que necessitam de plantio, de rega,
de vento, de luz, de pólen,
e, mais que tudo, de tempo.
Demoram para florir,
e, quando suas pétalas caem
(como, na verdade, as fazem cair as tormentas,
ou, se são tão suaves, um forte vento),
há que se cuidar, regar,
há que se renovar o cultivo, e o tempo,
para outra vez fazer florir.



PREÇO DE MULHER

Mulher, eu nunca entendi teu preço,
eu nunca compreendi teu jeito.
Tantas me deram coisas por coisas em troca,
mas sempre me deste coisas por nada.
Tantas me deram carinho por carinho,
afeto por afeto,
outras, piores, afeto por poder,
afeto por dinheiro.
Mas tu me tens dado tudo tão barato,
que não te compreendo o preço.
Mulher, tantas negociam tanto,
aliás, todas negociam este trato,
exigem fidelidade, atenção, cessões mútuas,
Mas tu, mulher, tens me dado tudo de graça.
Não fazes exigências, não cobras nada,
te contentas com tão pouco.
Um pouco de atenção, umas poucas palavras,
te contentas com tão pouco que
por vezes duvido de tua santidade.
E mais, sacrificas tudo.
Outras negam um prato quente, uma bainha,
todas têm mil exigências,
mas tu, generosamente, apenas queres minha presença,
e sequer ao teu lado.
Parece que te contentas com minha existência,
com o fato de eu estar vivo e bem, obrigado.
E é este teu preço tão barato que não me convence,
que não se explica,
eu não entender este teu preço, mãe,
justamente tu, que és tão cara,
e eu barato, e fazes tudo por nada.



VELÓRIO

A rotina de sempre.
As pessoas, passo a passo,
lágrimas presas no canto
dos olhos.
As roupas escuras,
comentários rápidos.
A barca sai em cinco minutos.
As faces jocosas,
rindo não sei de quê,
e as faces melancólicas
vendo o morto dentro de si.
Vejo todo dia, como numa procissão,
a ida da vida e da morte
no velório dos homens vivos.



DESPEDIDA

Desculpe, eu queria ficar aqui,
mas eu só tenho esta vida,
não dá para gastar todo esse tempo
nesse único local,
nesse até mesmo seguro abrigo.

Eu preciso caminhar mais um pouco,
me assustar, me aborrecer,
mas sorrir diante de uma nova face,
de uma nova estrada, de um novo lugar

Talvez só para sentir algo novo
e tentar, mais uma vez,
escrever uma poesia.



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Fonte:
Academia Niteroiense de Letras

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