TRAÇOS AZUIS
A A...
Escuto-te essa voz
esplêndida, sonora;
E sonho o meu viver
tranquilo, radiante,
Quando sinto-te,
filha, a cabecinha loira
Tombada no meu
peito, alegre e palpitante.
Beijo-te mansamente
os lábios cor de aurora,
Inundado de um
júbilo heroico e triunfante;
E penso que nós
vamos pela existência afora,
Como quem leva a
alma aberta e cintilante.
Vejo no teu olhar
aquela mansidão,
Suave e luminosa,
de um grande coração,
Há transbordar de
afagos, de festas e candura,
E creio que tu és a
flor resplandecente,
Que sobre mim
entorna um fluido rescendente,
Uns beijos, a tua
alma, ó doce criatura!
AS FARINHADAS
À
minha prima e poetisa Belarmina E. da Silva
Num esteio
pendurado
O candeeiro
ferrenho,
Derrama por todo
engenho.
Toda a família
abaixada
A mandioca
raspando,
No coxo a vai
atirando
Para ser depois
ralada.
O boi puxando
forçoso
A almanjarra pesada
Tem o andar vagaroso
E o escrevo
cantando
Vai a farinha
torrada
Ligeiramente
tirando.
A
Rodrigues Braga
O dia vem surgindo,
o dia esplendoroso!
A aurora traz-me um
beijo enorme, luminoso,
E faz que a flor
estenda as pétalas azuis
Aos vagalhões de
ouro de uma explosão de luz!
O coração palpita e
sente um mago eflúvio
Que inunda todo
peito assim como num dilúvio.
A grande mãe de
tudo, a vasta natureza
Sente a latejação
das formas da beleza.
O colibri dourado a
namorar a flor
Murmura-lhe ao
ouvido uns cânticos de amor.
O dia é uma alegria
heroica, colossal!
Dele é que emana o
bem, da noite emana o mal.
Eu vi, perto do
templo atlético do Progresso,
A trabalhar
sozinho, febril como um possesso,
Um homem majestoso,
enérgico, viril,
Um rosto divinal
como um riso de Abril,
Que resistia ao
sono, à força do cansaço
Como resiste à bala
uma muralha de aço.
Era um lidar sem
fim, era um lidar bem nobre,
E não se lhe
importava que acabasse pobre
Com tanto que
chegasse, um dia, a concluir
Esse gigante férreo
que faz a gente ir,
Em menos de uma
hora, de Cádiz a Leão
Com a rapidez do
raio rolando na amplidão.
E vinte cinco anos
lutando sem cessar.
Esse homem que tem
os músculos do mar,
Os nervos de Vanin,
a força do querer,
Bradou: — Embora lute, do nada eu hei de erguer
Este colosso
ingente e forte como um muro.
Pra isso sacrifício
até o meu futuro.
...........................................
Fiquei a olhai-o calmo e mudo como a fraga...
E perguntei-lhe o
nome:
—
Eu sou Rodrigues Braga.
Aquele que lutou
por este dogma novo.
—
Abrir um horizonte de luz a este povo.
A marcha do
Progresso é a senda das auroras.
Quando se ouvir o
som, as vozes rugidoras,
Da máquina que
encurta a grande imensidade
Que tem a rapidez
da eletricidade
E que dá seiva aos
órgãos das nações
Na força gigantesca
dos membros de leões...
Quando chegar-se a
ver as formas monstruosas
Enormemente
grandes, ciclópicas, caprichosas
Do Adamastor altivo
e forte e vigoroso,
Que nunca tem
descanso e nunca tem repouso
Que anda em uns
labores ativos, colossais
Que fazem-nos
lembrar os crânios geniais,
Que encaminha a
marcha para as regiões de além
Sem demorar-se
nunca, sem escutar ninguém
Quando sentir-se a
orquestra, as mágicas surgem.
Que saem bem do
peito das vastas oficinas
Envoltas
simplesmente nessas cintilações
Que partem dos
brasidos, dos rúbidos carvões,
Que fazem do Escuro
um grande mar de luz
Divino como o rosto
esplêndido de Jesus...
Então, havemos nós,
num êxtase triunfante,
Por entre
sensações, alegremente a rir,
Ao fogo que
rebrilha gritar: — Avante! Avante!
Que se escancaram
as portas vermelhas do Porvir.
TONS AURORAIS
À
encantadora menina Julieta de Lima Ferreira
Quando te vejo,
criança,
Vermelha como o
arrebol,
De olhos cor de
esperança,
Cabelos da cor do
sol!
Brincando alegre,
risonha
Com bonequinhas
mimosas,
Como quem,
dormindo, sonha
Com coisas
fantasiosas!...
Eu penso
profundamente
Nessa quadra de
magia
Em que tu, lírio
ridente!
Colhes mil beijos
suaves
Como a celeste
harmonia
Do canto imenso das
aves.
ATRAVÉS DO PASSADO
A
Arão Ramos
Amigo! Quando lanço
a vista penetrante
Por entre as nuvens
róseas de uma era esvaecida,
E sinto uma saudade
heroica, indefinida
Bater-me o coração — o órgão galopante...
Amigo! Quando à
mente as rúbidas lembranças
Me vêm, patenteando
aqueles belos dias
Que a gente tem o
seio arfando de esperanças
Transpondo os
penetrais das mansas alegrias...
Amigo! Quando
lembro-me das infantis quimeras
Que no passar
roçavam o lago azul das cismas
Em busca de ideais
e frescas primaveras...
Sinto dentro do
peito um brando misticismo,
Uns saltos
vigorosos, soturnos, de aneurismas,
Uma tristeza doce,
um são melancolismo!
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Fonte
"Toda a Poesia: Antologia Poética". Poeteiro Editor Digital. São Paulo, 2015.
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