Pedro Lyra: "5 Poemas"

SONETO DE CONSTATAÇÃO – VI

O MAIS PRESENTE

O que é que nos arrasta pela Terra?

“A Fé”

– responde em coro a Religião,

apontando a um espaço transcendente.

Mas, a Filosofia:

– “É a Razão”,

erguendo a nossa marca essencial.

“É o Interesse”

– brada a Economia,

exibindo as mais simples atitudes.

Mas, a Psicologia:

– “É o Desejo”,

expondo as privações em cada olhar.

Fundindo os quatro mitos

talvez temos

a síntese da humana condição:

um cava o Salvamento;

outro, a Verdade;

outro, o Poder;

outro, a Felicidade.

Mas, dentro a todos, tem que estar o Amor.

SONETO DE AFIRMAÇÃO – I

O MAIS TÍPICO

O que é que nos define

como Homo

e nos distingue

dos demais viventes?

“A Criação!”

– Só nós forjamos meios.

(A maioria nunca criou nada.)

“A Razão!”

– Livre guia das escolhas.

(Mas é também usada pra loucuras.)

“A Crença!”

– Apenas nós temos um Deus.

(Os peixes criariam um marinho.)

São três dos mais preciosos atributos

e nenhum nos distingue ou nos define.

É a Mutação:

– só nós evoluímos.

E só a morte nos limita o ser.

No cerne da perfectibilidade,

a eterna condição de a atualiz

  

SONETO DE CONSTATAÇÃO – LXIII

O MAIS FORTE

O que é maior em nossa condição?

“O Amor!”

– responde o moço enamorado:

“Só ele dá sentido

a esta existência”.

(Mas até um amante o contraria.)

“É a Fé!”

– rebate o crente em contrição:

“Ela nos leva

ao verdadeiro Ser.”

(Mas se dirige à própria incertitude.)

“A Esperança!”

– sustenta o renegado:

“É ela que alimenta

a última chama.”

(Mas ela falha muito mais que vinga.)

“É a Dor!”

– exibe o pobre agonizante:

“O ser humano nasce

em sofrimento;

vive lutando

pra escapar aos males;

e vem morrer

em novo sofrimento.”

SONETO DE AFIRMAÇÃO – XXII

O BEM MAIOR

Entre imanentes ou aleatórios,

qual é

o bem maior

da nossa raça?

“A Liberdade!”

– Pra fazer e agir.

(Em condições normais

nasce-se livre.)

“A Saúde!”

– Sem ela, o ser é nulo.

(Do mesmo modo

nasce-se saudável.)

São comuns:

só governos e acidentes

podem privar-nos desses atributos.

Os bens especiais são bens avaros

e variam

de um ser a outro ser.

“A Beleza!”

– Esplendor da alma e do corpo!

“O Talento!”

– Esplendor da alma e da mente!

Com um destes

conquista-se o Universo.

Sem ambos

melhor fora desnascer.

SONETO DE AFIRMAÇÃO – XXIII

A MAIS ALTA

Qual a mais alta criação humana?

“A Ciência!”

– proclama um Inventor:

“Poliu o Cosmos e engendrou as mídias.”

E o Pensador:

“Não: é a Filosofia!

Foi ela que aclarou o nosso Ser.”

“É a Moeda!”

– rebate o Negocista:

“Permitiu-nos as trocas e a fortuna.”

Um Poeta canta:

“É a Arte:

ela funde

e recria

e transcende o Ser e a Vida.”

(Nenhum corrupto se atreveu:

“O Estado!”)

“É a Linguagem!”

– mostra uma Criança:

“Sem ela, nem podiam perguntar.”

E finalmente irrompe o mais convicto:

“Evidente que é Deus!”

– brada o Profeta.

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Fonte:
Revista Brasileira: Fase VIII Janeiro-Fevereiro-Março - 2015  - Ano IV Nº 82