sexta-feira, 13 de novembro de 2015

José Maria do Amaral: "5 Poemas"

PASSASTE COMO A ESTRELA MATUTINA

Passaste como a estrela matutina,
Que se some na luz pura da aurora;
Da vida só viveste aquela hora
Em que a existência em flor luz sem neblina.

Ver-te e perder-te! De tão triste sina
Não passa a mágoa em mim, antes piora;
Sem ver-te já, minha alma ainda te adora
Em triste culto que a saudade ensina.

Não vivo aqui; a vida em ti só ponho,
Na fé, de Cristo filha, a dor abrigo,
Futuro em ti no céu vejo risonho!

Neste mundo, meu mundo é teu jazigo;
Dizem que a vida é triste e falaz sonho,
Se é sonho a vida, sonharei contigo.



TRISTEZA AMARGA

Não chames sonhos a tristeza e dores
Do coração que chora a mocidade,
Na tarde triste da tristonha idade,
Que é tronco seco onde morreram flores.

Sonhos não são; nem são já sonhadores
Os que da vida sabem a verdade;
Dor pungente e real é a saudade
Do tempo em que de nós fomos senhores.

Nossos não somos já, senão da morte,
Quando entre o mundo está e a sepultura
Em fase derradeira, a nossa sorte;

Quem pode então lembrar, sem amargura,
Tenha embora o vigor do ânimo forte,
Que vai da vida a luz ser noite escura!



SE VOZ CRISTÃ EM TOM HARMONIOSO

Se voz cristã em tom harmonioso
Dos mortos à mansão seu hino envia,
Rompe talvez a morte a letargia,
O espectro acorda quase esperançoso!

Do teu benigno metro, tão piedoso,
Minha descrença ouviu a melodia;
A fé quase sorriu quando te ouvia!
Deu ao mundo um olhar quase saudoso!

Desertas ruínas onde reina a calma
Têm na tristeza graça e têm doçura
Se ao pé lhes nasce esbelta e verde palma:

Assim teu canto de cristão doçura
É, nos ermos sombrios de minh'alma,
Rosa que enfeita velha sepultura!....



TRISTEZAS DE MINHA ALMA TÃO SENTIDAS

Tristezas de minha alma tão sentidas,
Que sois doces memórias do passado,
Do tempo já vivido, e tão lembrado,
Ainda me dais as horas já perdidas!

Horas de tanto bem, tão bem vividas,
Quando vivi feliz e descuidado,
Sejam ao coração desenganado
Sonhos que enganem dores tão gemidas

Tem hoje o meu viver tal agonia,
Que é doçura a tristeza da saudade,
E a saudade do tempo é poesia.

Flores da quadra sois da mocidade,
Minha velhice em vós se refugia,
Tristezas de minha alma em soledade...



MANHÃ EM PETRÓPOLIS

Que dourada manhã, que luz mimosa
Enverniza dos campos a verdura!
Que aura cheirosa e cheia de brandura!
Será, quem sabe, o respirar da rosa?

Doura-se em luz a serra majestosa,
Das flores leva a Deus a essência pura;
Dos pássaros nos sons com que doçura,
Canta a floresta antífona maviosa!

D´alma em ternura a ti sobem louvores,
Bendito criador da natureza!
Quem vê sem te adorar tantos primores?

Que humano rosto em si tem tal beleza?
De qual beleza nascem mais amores?

E quais amores têm tanta grandeza?


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Fonte
"Toda a Poesia: Antologia Poética". Poeteiro Editor Digital. São Paulo, 2015.

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