ÉBRIO
Querem que
eu ria, que o prazer alheio
Seja meu,
que o partilhe e o acompanhe;
Que a
ventura que banha aos outros, banhe
Meu negro
peito de tristeza cheio.
Seja!
Bradai; nenhum de vós estranhe
Mais nesta
roda um rosto triste e feio;
Quero
beber e rir, pois já não creio
Senão que
existem males e champagne.
E uma taça
após outra fui bebendo;
Sempre
bebendo, vi dançar a mesa,
E os meus
convivas fui desconhecendo.
Ébrio
afinal, caí... mas não sozinho:
Comigo
estavas, porque a natureza
Do meu
amor embriaga mais que o vinho.
LONGE
Longe de
mim!... Só a amplidão vazia!
Sol, em
que céu de bronze te escondeste?
Céu,
porque assim tão baixo tu desceste
E
esmagas-me se dó desta agonia?
Nem um
adeus, ao menos me disseste;
Foste-te e
eu, cego, já não tenho guia;
Meus olhos
mais nem uma estrela fria
Verão,
pois deles desapareceste.
Ah! nunca
saibas meu pesar revendo
Tudo
aquilo que vias estavas
Nos meus
braços de medo e amor tremendo.
Longe de
mim!... Por mais que chame e brade,
Apenas
ouve as minhas vozes cavas
Esta
saudade, esta imortal saudade!
AOS FELIZES
A Henrique Silva
Pensais
que invento penas por meu gosto,
Que em
meus versos afeto sofrimento?
Néscios?
Lede nas linhas do meu rosto,
E com
verdade me dizei se invento.
Ride
felizes, ride que o desgosto
Nunca
deixou de vir; em breve o alento
Que hoje
tendes tê-lo-eis como o sol posto:
Longe e
brilhando apenas um momento.
"Mas,
me direis, como te enganas! Ama,
Ama, que
perderás essa tristeza,
Terás
ventura, terás glória, fama..."
E eu, por
vingar-me, sufocando o ai!
Do coração
ferido, com firmeza,
Por meu
turno respondo-vos - amai!
MORTE
És negra,
és negra, dizem-me os felizes,
Dizem que
ao ver-te o vulto atro e sombrio,
Gelam-se
os corações, tamanho frio,
Serena,
espalhas onde quer que pises.
É que tu
levas para um céu vazio,
Onde
somente as dores tem raízes,
As
esperança todas, e não dizes
Nada a
quem fica, nem a quem partiu,
Anjo
negro, terror da humanidade,
Morte,
estilete que nos toca o fundo
D’alma,
enchendo de mágoa e de saudade!
Morte, há
no mundo tanta dor contida!
Que, tu,
que findas todo o bem do mundo,
És a coisa
melhor que há nesta vida.
PARADOXO
Se
encontrares alguém no teu caminho,
Que do teu
pranto menoscabe, rindo,
Que te
ouvindo gemer, teus ais ouvindo,
Quebre na
face o rictus do escarninho;
Se
encontrares alguém que, descobrindo
No recesso
da tua alma íntimo espinho,
Em vez de
dar-te fraternal carinho,
Aprofunde-te
a dor que estás sentido;
Não te
zangues com ele, não te zangue
O
desgraçado riso que lhe vires;
Toca-lhe o
peito - poreja sangue;
Toca-o:
verás que fementidos modos!
Sonda-o:
verás, por tudo que lhe ouvires
Que ele é
mais desgraçado que nós todos.
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Fonte
"Toda a Poesia: Antologia Poética". Poeteiro Editor Digital. São Paulo, 2015.
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