DESTINOS
Traçou entre nós
dois o Nume Eterno
Uma linha, que,
apenas, se revela:
Nem a passa a
vaidade - menos bela,
Nem a transpõe o
orgulho - alto e superno
Envelhecemos!... A
lareira o inverno
Já de neve cobriu;
e, agora, nela
A cinza fria da
saudade vela
Os resplendores do
braseiro interno...
Mágoas calaste;
humilhações calei-as;
Se, hoje, temo
passados desatinos,
Tu de antigas
loucuras te arreceias...
Cumpriremos,
assim, nossos destinos:
Tais duas torres,
que ruíssem, cheias
Do repique festivo
dos seus sinos!
SAGRADA PAIXÃO
Por teu querer,
tão só, foi que seguiste
Desse amor toda a
rua da amargura;
E, três vezes
caindo, a face pura
Aos céus ergueste,
cada vez mais triste!
Mas, por essa
paixão, a que, ora, assiste
A turba, e que teu
rosto desfigura;
Pelo beijo
traidor, pela tortura
Foi que a
imortalidade conseguiste!
Essa agonia é tua
Glória! E quando
Estrugir a
blasfêmia dos perversos,
Que se te cale o
corpo miserando:
Fica-te assim -
olhos nos meus imersos,
De espinhos
coroada, ao sol, sangrando,
Nua, crucificada
nos meus versos!
FORTE ABANDONADO
(Obrigada a
consoante de apoio)
De pé, no
promontório, encravado na bronca
Penedia, onde o
mar atropelado ronca,
Ribomba, estoura,
estruge, espoca, estronda, esbarra,
Abandonado avulta
o vigia da barra!
Ó naus, podeis
entrar! Podeis vir, exilados,
Peixes, que íeis
buscar abrigo em outros lados,
Quando o bruto
estridor dos canhões sacudia
O fraguedo; e a
fumaça o almo esplendor do dia
No firmamento
azul, empanava de chofre,
Saturando todo o
ar de salitre e de enxofre!
Pássaros, volitai!
Nada aqui vos aterra:
As máquinas de
morte estendem-se por terra,
Frias, mudas, sem
mais aquele brilho antigo
Que era para a
pupila um ríspido castigo!
No muro, em cada
frincha, a grama brota inculta,
Cobre as
trincheiras, enche as guaritas, oculta
As arestas,
contorna as ameias, procura
Tapar a barbacã
com a trama verde-escura!
Agora o rubro
aqui, aparece ridente,
Não em funda
ferida estuando um sangue ardente
E impetuoso de
heróis varado nas batalhas,
Mas em flores
gentis desbrochando nas talhas
Do molhe de
granito! Os rumores de passos
E toques de
clarins não enchem os espaços
Agora! E que
contraste estes ruídos, maninhos,
Mortíferos
canhões, guardam ninhos e ninhos,
Paz e Amor!...
Pode a abelha as melífluas colmeias
Fabricar sem
temor, ao longo das ameias!
Pode aqui vicejar
a tímida violeta!
Pode adejar a
iriante e inquieta borboleta!
Sempre azul seja o
céu! A liana filiforme
Medre e floresça!
A brisa em fruto a flor transforme!
Venha o rijo
Aquilão soprar a pulmão pleno!
Venha a Lua banhar
de luz o terra-pleno
Venha aqui dentro
o Sol e esta terra fecunde!
Venha o musgo
crescendo e a muralha circunde!
Venha gemer o mar,
que espumarento, esbarra
No rochedo em que
dorme o vigia da barra!
POR QUÊ?
Ris, se digo que
és boa; e se te digo
Que és má, tomas
um ar de indiferença...
Fazes um gesto
vago de descrença,
Quando afirmo
serei teu muito amigo...
Se de tuas
promessas te desligo,
Amuas-te; e é
fatal a desavença,
Ao te falar da
gratidão imensa
E do respeito meu
para contigo...
Se as mãos te
beijo, cedes; mas, fremente,
Se a procuro, essa
boca me resiste!...
Enfado-me,
gargalha loucamente!
Não sei, porém, se
alta razão te assiste,
Se a atitude é de
sábio ou de demente,
Quando, ao jurar
que te amo, ficas triste!
MEU JARDIM
Nessa alongada
infância, à luz serena
Do luar da prece,
em vago odor delida,
Florescia o jardim
da minha vida,
Alvejante de lírio
e de açucena.
Depois, na
adolescência, manhã plena
De rubores e
cantos, sem medida,
Ao abrir da corola
apetecida,
A rosa do desejo o
ar envenena...
Depois... volúpia
louca e amor conforto...
Desentranhou-se,
ao sol da mocidade,
Em papoulas e
cravos o meu horto...
Enfim, velhice!...
Já com a sombra invade
O canteiro, onde
jaz meu sonho morto,
Floração de
perpétua e de saudade!...
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