ELOGIO DE AVEIRO
Talábrica
senil, famoso Aveiro,
Bordado de
riquíssimas salinas,
Que com
tuas alvíssimas colinas
Formas um
pitoresco tabuleiro;
Tu foste
audacioso marinheiro
Que
rasgando altas ondas cristalinas
Em África
arvoraste as Lusas Quinas
E de Benim
descobridor primeiro.
Tu das
últimas praias do ocidente
Aos
Áfricos sertões nossa lei pura
Levaste, e
nos mostraste a baga ardente.
Pela tua
atrevida sangradura
A estrada
se encontrou do rico Oriente,
Onde o
Gama depois audaz fulgura.
QUEM NÃO AMA, DESMENTE A NATUREZA
Se a flor
namora a flor que lhe é vizinha,
Se uma
palma com outra enlaça os ramos,
Se nos
prados, com cândidos reclamos,
Namora uma
avezinha outra avezinha.
Se o mundo
o seu Autor quando o sustinha,
Nos eixos
do poder, que acreditamos,
Na longa
rotação que divisamos,
Viu que,
para o suster, Amor convinha:
Se Amor é
um dever que impresso existe
Em tudo
que vegeta a redondeza,
Em que o
governo universal consiste:
Quem se
exime de amor e a Amor despreza?
Quem ataca
esta Lei? Quem lhe resiste?
Quem não
ama, desmente a Natureza.
BASTA, NÃO POSSO MAIS, MUNDO ENGANOSO!
Basta, não
posso mais, Mundo enganoso!
Findaram
para mim teus vãos prazeres.
Envelheci
com eles, que mais queres
Deste
escravo ancião, fraco e rugoso?
Se o teu
carro triunfal puxei, fogoso,
Quando
inda forças tinha, nada esperes
Deste
caduco mais: quanto fizeres
Para outra
vez servir-te, é duvidoso.
Enquanto
não pensei, fui encantado:
Bebendo em
taças de ouro o teu engano,
Eu fui,
por ti, em bruto transformado.
Graças, graças
ao santo Desengano,
Que a
forma de homem outra vez me há dado,
Livrando-me
de um mágico tirano!
ÀS CAMBALHOTAS SEMPRE ANDA A TRAVÉS
Às
cambalhotas sempre anda a través
O Mundo,
sem poder-se endireitar.
Velho,
bêbado e tonto, a cambalear,
Já não pode
suster-se sobre os pés.
Tudo nele
se vê hoje de invés
Pois seu
eixo quebrou, anda a rolar
Não há
homem que o possa consertar:
Só se for,
do Arquiteto a mão que o fez.
Tornou-se
num pião: qualquer rapaz
O faz dar
quatro voltas c'um cordel
E na palma
da mão dançar o faz.
O que hoje
fez de grande o seu papel,
Amanhã
representa de Gil Blás
Neste
imenso teatro de Babel.
Francisco
Joaquim Bingre, in 'Sonetos'
DEUS, INFINITO SER
Deus,
Infinito ser, nunca criado,
Sem
princípio, nem fim, na Majestade
Que no
trono da Eterna Divindade
Tens o
Mundo num dedo dependurado:
Tu estavas
em Ti, não foste nado,
O teu Ser
era a tua Imensidade,
Tu tiveste
por berço a Eternidade,
Tu, sem
tempo, em Ti mesmo eras gerado!
Tu és um
fogo que arde sem matéria,
Tu és
perpétua luz, que não desmaia
Fulgindo,
sem cessar, na sala etérea!
Tu és um
mar de amor, que não tem praia,
Trovão
assustador da esfera aérea,
Rei dum
Reino Imortal, que não tem raia!...
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Fonte
"Toda a Poesia: Antologia Poética". Poeteiro Editor Digital. São Paulo, 2015.
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