SONETO
Desponta a
estrela d’alva, a noite morre.
Pulam no
mato alígeros cantores,
E doce a
brisa no arraial das flores
Lânguidas
queixas murmurando corre.
Volúvel
tribo a solidão percorre
Das
borboletas de brilhantes cores;
Soluça o
arroio; diz a rola amores
Nas verdes
balsas donde o orvalho escorre.
Tudo é luz
e esplendor; tudo se esfuma
Às
carícias da aurora, ao céu risonho,
Ao flóreo
bafo que o sertão perfuma!
Porém
minh’alma triste e sem um sonho
Repete
olhando o prado, o rio, a espuma:
- Oh!
mundo encantador, tu és medonho!
ILUSÃO
Sinistro
como um fúnebre segredo
Passa o
vento do Norte murmurando
Nos densos
pinheirais;
A noite é
fria e triste; solitário
Atravesso
a cavalo a selva escura
Entre
sombras fatais.
À medida
que avanço, os pensamentos
Borbulham-me
no cérebro, ferventes,
Como as
ondas do mar,
E me
arrastam consigo, alucinado,
À casa da
formosa criatura
De meu
doido cismar.
Latem os
cães; as portas se franqueiam
Rangendo
sobre os quícios; os criados
Acordem
pressurosos;
Subo
ligeiro a longa escadaria,
Fazendo
retinir minhas esporas
Sobre os
degraus lustrosos.
No seu vasto
salão iluminado,
Suavemente
repousando o seio
Entre
sedas e flores,
Toda de
branco, engrinaldada a fronte,
Ela me
espera, a linda soberana
De meus
santos amores.
Corro a
seus braços trêmulo, incendido
De febre e
de paixão... A noite é negra,
Ruge o vento
no mato;
Os
pinheiros se inclinam, murmurando:
- Onde vai
este pobre cavaleiro
Com seu
sonho insensato?...
DEIXA-ME!
Quando
cansado da vigília insana
Declino a
fronte num dormir profundo,
Por que
teu nome vem ferir-me o ouvido,
Lembrar-me
o tempo que passei no mundo?
Por que
teu vulto se levanta airoso,
Tremente
em ânsias de volúpia infinda?
E as
formas nuas, e ofegante o seio,
No meu
retiro vens tentar-me ainda?
Por que me
falas de venturas longas,
Por que me
apontas um porvir de amores?
E o lume pedes
à fogueira extinta,
Doces
perfumes a polutas flores?
Não basta
ainda essa existência escura,
Página
treda que a teus pés compus?
Nem essas
fundas, perenais angústias,
Dias sem
crenças e serões sem luz?
Não basta
o quadro de meus verdes anos
Manchado e
roto, abandonado ao pó?
Nem este
exílio, do rumor no centro,
Onde
pranteio desprezado e só?
Ah! não me
lembres do passado as cenas,
Nem essa
jura desprendida a esmo!
Guardaste
a tua? a quantos outros, dize,
A quantos
outros não fizeste o mesmo?
A quantos
outros, inda os lábios quentes
De
ardentes beijos que eu te dera então,
Não
apertaste no vazio seio
Entre
promessas de eternal paixão?
Oh! fui um
doido que segui teus passos,
Que dei-te
em versos de beleza a palma;
Mas tudo
foi-se, e esse passado negro
Por que
sem pena me despertas n’alma?
Deixa-me
agora repousar tranquilo,
Deixa-me
agora dormitar em paz,
E com teus
risos de infernal encanto
Em meu
retiro não me tentes mais!
O VIZIR
- Não
derribes meus cedros! murmurava
O gênio da
floresta aparecendo
Adiante de
um vizir, senão eu juro
Punir-te
rijamente! E no entanto
O vizir
derribou a santa selva!
Alguns
anos depois foi condenado
Ao cutelo
do algoz. Quando encostava
A cabeça
febril no duro cepo,
Recuou
aterrado: - “Eternos deuses!
Este cepo
é de cedro!” E sobre a terra
A cabeça
rolou banhada em sangue!
NÃO TE ESQUEÇAS DE MIM!
Não te
esqueças de mim, quando erradia
Perde-se a
lua no sidéreo manto;
Quando a
brisa estival roçar-te a fronte,
Não te
esqueças de mim, que te amo tanto.
Não te
esqueças de mim, quando escutares
Gemer a
rola na floresta escura,
E a
saudosa viola do tropeiro
Desfazer-se
em gemido de tristura.
Quando a
flor do sertão, aberta a medo,
Pejar os
ermos de suave encanto,
Lembre-te
os dias que passei contigo,
Não te
esqueças de mim, que te amo tanto.
Não te
esqueças de mim, quando à tardinha
Se
cobrirem de névoa as serranias,
E na torre
alvejante o sacro bronze
Docemente
soar nas freguesias!
Quando de
noite, nos serões de inverno,
A voz
soltares modulando um canto,
Lembre-te
os versos que inspiraste ao bardo,
Não te
esqueças de mim, que te amo tanto.
Não te
esqueças de mim, quando meus olhos
Do sudário
no gelo se apagarem,
Quando as
roxas perpétuas do finado
Junto à
cruz de meu leito se embalarem.
Quando os
anos de dor passado houverem,
E o frio
tempo consumir-te o pranto,
Guarda
ainda uma idéia a teu poeta,
Não te
esqueças de mim, que te amo tanto.
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Fonte
"Toda a Poesia: Antologia Poética". Poeteiro Editor Digital. São Paulo, 2015.
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