terça-feira, 17 de novembro de 2015

Euclides da Cunha: "5 Poemas"

ROBESPIERRE

Alma inquebrável – bravo sonhador
De um fim brilhante, de um poder ingente.
De seu cérebro audaz – a luz ardente
É que[?] gerava a treva do Terror...

Embuçada num lívido fulgor
Su’alma colossal – cruel – potente
Rompe as idades, lúgubre – tremente –
Cheia de glórias, maldições e dor!.

Há muito já que ela – soberba ardida
Afogou-se – cruenta e destemida
– Num dilúvio de luz – Noventa e três...

Há muito já que emudeceu na história
Mas, ainda hoje a sua atroz memória
É o pesadelo mais cruel dos reis!...
  


DANTON

Parece-me que o vejo – iluminado –
Erguendo delirante a grande fronte
– De um povo inteiro o fúlgido horizonte
Cheio de luz, de idéias constelado...

De seu crânio – vulcão – a rubra lava
Foi que gerou essa sublime aurora
– Noventa e três e a levantou sonora
Na fronte audaz da populaça brava...

Olhando para a história – um séc’lo é a lente
Que mostra-me o seu crânio resplandente
Do passado através o véu profundo...

Há muito que tombou – mas inquebrável
De sua voz o eco formidável
Estruge ainda na razão do mundo!...



MARAT

Foi a alma cruel das barricadas...
Misto de luz e lama... se ele ria
As púrpuras gelavam-se e rangia
Mais de um trono se dava gargalhadas...

Fanático da luz... porém seguia
Do crime as torvas, lívidas pisadas –
Armava à noute aos corações ciladas –
Batia o despotismo à luz do dia...

No seu cér’bro tremendo negrejavam
Os planos mais cruéis e cintilavam
As idéias mais bravas e brilhantes.

Há muito que um punhal gelou-lhe o seio...
Passou... deixou na história um rastro cheio
De lágrimas e luzes ofuscantes...


SAINT-JUST

Un discours de Saint-Just donna tout de suite
un caractère terrible au débat...
Raffy – Procès de Louis XVI

Quando à tribuna ele se ergueu, rugindo –
– Ao forte impulso das paixões audazes
Ardente o lábio de terríveis frases
E a luz do gênio em seu olhar fulgindo

A tirania estremeceu nas bases
De um rei na fronte ressumou – pungindo.
Um suor de morte e um terror infindo
Gelou o seio aos cortesãos sequazes –

Uma alma nova ergueu-se em cada peito,
Brotou em cada peito uma esperança
De seu sono acordou – firme – o Direito –

E Europa – o mundo, mais que o mundo – a França
Sentiu numa hora, sob o verbo seu,
As comoções que em séc’clos não sofreu...



NO TÚMULO DE UM INGLÊS

 És bem feliz, mylord!... na tua tumba fria
Um sono gozas, bom — no seio da soedade
Feliz!... não tens o Sol de tu'Albion sombria
Mas tens o olhar de Deus — O Sol da eternidade!...

És bem feliz mylord a triste ventania
Soluça nos ciprestes os cantos da saudade...
Quem sabe se te traz — em vozes de agonia—
Os risos e as canções de tua mocidade!...

Estás livre do splen... invejo-te deveras...
Do túmulo a sombra espanca as pálidas quimeras.
— Em teu berço de pedra embala-te a soidão...

És bem feliz mylord — assim antes eu fora!...
Tu tens a calma eterna, a solidão sonora
E tu não tens — feliz — não tens — teu coração...
Fonte
"Toda a Poesia: Antologia Poética". Poeteiro Editor Digital. São Paulo, 2015.

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