VENCIDOS
Nós
ficaremos, como os menestréis da rua,
Uns
infames reais, mendigos por incúria,
Agoureiros
da Treva, adivinhos da Lua,
Desferindo
ao luar cantigas de penúria?
Nossa
cantiga irá conduzir-nos à tua
Maldição,
ó Roland?... E, mortos pela injúria,
Mortos,
bem mortos, e, mudos, a fronte nua,
Dormiremos
ouvindo uma estranha lamúria?
Seja. Os
grandes um dia hão de cair de bruço...
Hão de os
grandes rolar dos palácios infetos!
E gloria à
fome dos vermes concupiscentes!
Embora,
nós também, nós, num rouco soluço,
Corda a
corda, o violão dos nervos inquietos
Partamos!
inquietando as estrelas dormentes!
GLÓRIA
Ao I. Serro Azul
Quando um
dia eu descer às margens desse lago
Estígio,
onde Caron, mediante uma parca
Moeda de
estanho vil ou cobre, que eu lhe pago,
Há de me
transportar numa sombria barca...
Quando sem
um sinal, sem uma prova ou marca
De afeição,
eu me for por esse abismo vago,
Vendo que
sobre mim funebremente se arca
O céu, e
junto a mim esse Caron pressago...
E
envolvido na mais completa obscuridade,
Abandonado,
e só, e triste, e silencioso,
Sem a
sombra sequer do orgulho e da vaidade,
Eu tiver
de rolar no olvido, que me espera,
Que ao
menos possa ver o palácio radioso,
Feito de
louro e sol e mirto e ramis de hera!
METAMORFOSES
A Mme. Georgine Mongruel
Sei que há
muita nudez e sei que há muito frio,
E uma
voracidade horrível, um furor
Tão desmedido
que, quando eu acaso rio,
Quantos
não estarão torcendo-se de dor.
Conheço
tudo, sim, apalpo, indago, espio...
Tenho a
certeza que vá eu para onde for,
Como o
escaravelho, hei de o ódio sombrio
Ver
enodoar até o seio de uma flor.
Mas sei
também que há mil aspirações estranhas,
Que
havemos de subir montanhas e montanhas,
Que a
Natureza avança e o Homem faz-se luz...
Que a
Vida, como o sol, um alquimista louro,
Tem o dom
de poder mudar a lama em ouro,
E em
límpidos cristais esses rochedos nus!
CORRE MAIS QUE UMA VELA...
Corre mais
que uma vela, mais depressa,
Ainda mais
depressa do que o vento,
Corre como
se fosse a treva espessa
Do
tenebroso véu do esquecimento.
Eu não sei
de corrida igual a essa:
São anos e
parece que é um momento;
Corre, não
cessa de correr, não cessa,
Corre mais
do que a luz e o pensamento...
É uma
corrida doida essa corrida,
Mais
furiosa do que a própria vida,
Mais veloz
que as notícias infernais...
Corre mais
fatalmente do que a sorte,
Corre para
a desgraça e para a morte...
Mas que
queria que corresse mais!
SÚCUBO
Desde que
te amo, vê, quase infalivelmente,
Todas as
noites vens aqui. E às minhas cegas
Paixões, e
ao teu furor, ninfa concupiscente,
Como um
súcubo, assim, de fato, tu te entregas...
Longe que
estejas, pois, tenho-te aqui presente.
Como tu
vens, não sei. Eu te invoco e tu chegas.
Trazes
sobre a nudez, flutuando docemente,
Uma túnica
azul, como as túnicas gregas...
E de leve,
em redor do meu leito flutuas,
Ó Demônio
ideal, de uma beleza louca,
De umas
palpitações radiantemente nuas!
Até, até
que enfim, em carícias felinas,
O teu
busto gentil ligeiramente inclinas,
E te
enrolas em mim, e me mordes a boca!
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Fonte
"Toda a Poesia: Antologia Poética". Poeteiro Editor Digital. São Paulo, 2015.
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