terça-feira, 24 de novembro de 2015

Adriano Nunes: "5 Poemas"

VENENO

Pequeno
Poema,
Não penses
Que tens
Direito
A ver-me
Contente.
Eis que
Bem seja
A vez.
Não é
Tão certo
Que Eros
Submete
Meu tempo
À métrica
Dos teus
Desejos.
Trouxeste o
Veneno.
E beber
Irei.
É lei.



AGORA

Sonha com o harém
Que virá além.
Quer o paraíso
Acima dos riscos.
Todos, ímpios, podem
Ser seus inimigos,
Só não esse norte.
Acordou disposto
Às quatro e dezoito.
Às cinco, pra Meca
Volta-se e assim reza.
Não tem tanta pressa.
Não tem mais o medo
De dar-se a si mesmo.
O metrô lotado,
Gente a todo lado.
Segue, passo a passo,
O que lhe foi dito,
Sem um embaraço.
Pressente até perto
Ao céu seu ingresso.
Distraído esbarra
Numa mulher árabe.
Diz: ‘Alah bem sabe!’
Escuta-se a rádio
Local. Tudo calmo.
Dá-se à própria sorte
E, súbito, explode.



ELOGIO À IRONIA

Cansado de não ter respostas, cansado
De inúmeras perguntas, muito cansado
De ver em cada verso o termo cansado.
Ora, um soneto assim para quem importa?

Cansado do já gasto decassílabo,
(Observa, o verso prévio vinga quebrado!)
Fiz um com onze sílabas, para dá-lo
À exigência. Que bardo bem se comporta?

Deixemos essa arte torta de lado.
Louvemos os sinápticos erros práticos
Da escrita preguiçosa que nos conforta.

Espera! Estou cansado de só ter (algo
Há que não pode ser sequer explicado!)
Cansaço: onde há pra fugas a porta?



PEQUENO CANTO

O quarto, quase
Cúbico cárcere,
Quieto, Abraça-me.
São as lembranças,
As horas máximas
Em que as imagens
Do existir fazem-se
Plenas no olhar.
Um verso calha
Feito uma lágrima.
Felicidade,
Eu bem sei, quando
Ele vem hábil,
Com sua tática,
Para lançar-me
Além das grades
Do que o pensar
Deseja tanto,
Limites para a
Contemplação,
E pouco sabe.
Eis o meu canto,
Onde me alcanço
Intacto, bardo,
Donde pra o báratro
Do meu ser parto,
Onde baladas
Componho e quadras
Em ‹a› marcadas
Oferto, claro,
Pra ver o espaço
Preciso e amplo.
Simples recanto,
Fresta lacrada
Que às vezes dá
Pra a vida lá
Fora: que mágica
Engendrar para
Ter tudo, Atlântidas,
Ítacas, Martes,
Macondos, áureas
Pontes, Pasárgadas,
Com emoção,
Com as palavras?



ENTENDIMENTO
Para Horácio

diante do que ainda está
por vir, do raro entendimento,
sobre o que devo fazer
neste momento, sem pressa,

medos, angústias, sem erro
de cálculo, dar um passo
adiante do porvir,
desse instrumento sintático

a invadir-me a todo instante,
sobre o que além construir
com o que abrigo em mim, dentro,
com o arcabouço cinzento,

se um poema ou o que bem penso,
admito: quero o infinito
perto, as musas, todo canto: um
poema é mais importante.

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