O VELHO
Conta-se
que um certo moço, no esplendor de sua juventude, estava enfastiado de sua
mocidade e nutria de grande inveja dos anciões. Dizia a todos que os instantes
de maior felicidade eram aqueles em que se imaginava velho e de barbas longas e
brancas. Por isso, nunca era visto entre os da sua idade ou fazendo aquilo que
normalmente fazem os jovens. Ao contrário, gostava de frequentar os lugares
próprios para os velhos e se divertir junto com eles.
Esse seu
surpreendente apreço pelo o senil, o levou a adquirir hábitos que se tornaram
demasiadamente estranhos aos olhos de quase toda a cidade, e inaceitáveis para
os mais íntimos. Passou a vestir-se à maneira dos idosos, andava de bengala e
meio giboso como eles, deixou a barba crescer e começou a se interessar por
filosofia e literatura antiga.
Alguns
acreditavam que tinha perdido o juízo e que deveria ser atirado ao manicômio,
ou “ao asilo”, diziam outros com sarcástica ironia. Quantos aos próprios
velhos, as opiniões divergiam. Havia aqueles que viam nas atitudes do rapaz um
exemplo inspirador de veneração e de respeito, o qual, por seus méritos,
merecia ser compreendido e imitado; a maioria, porém, seguia pelo mesmo bojo da
multidão, que o tomava como demente e alienado.
O tempo,
entretanto, mostrou que o excêntrico modo de agir do moço não indicava qualquer
sinal de demência ou alienação. Em vez disso, tornavam-no gentil e benevolente
com todos, especialmente com os de mais idade, e de tal modo que conquistou a
simpatia e o respeito deles.
Mas esse
mesmo tempo, como bem disse um outro bom velho, é um rato roedor das coisas,
que as diminui ou altera no sentido de lhes dar outro aspecto. E foi assim que
envelheceu o nosso jovem.
Aos
setenta anos, sentia-se cansado e saudoso dos velhos anos que não voltam mais.
A velhice o havia surpreendido e agora amava a juventude como nunca havia amado
antes. Amava e desejava o que não tinha.
Com o
passar dos anos, ficou desgostoso e passou a imitar os jovens, a querer ser
jovem. Fez a barba e tentou, em vão, livrar-se da bengala. Esforçava-se para
mostrar que podia fazer as mesmas proezas de antanho, e muitas vezes teve de
ser levantado, em praça pública, ante os risos dos mancebos e das donzelas.
Alardeava aos quatro ventos que odiava a velhice e maldizia as cãs
embranquecidas. Sofria assim sua decrepitude mental e física.
Em certo
dia, descansava de sua velhice debaixo de uma frondosa e refrescante árvore,
quando um moço, na áurea de sua juventude, passava por ali e ouviu-o murmurar
algumas palavras confusas. Aproximou-se dele e perguntou-lhe se estava bem, se
precisava de alguma coisa, se queria conversar... O idoso ergueu-se
cambaleando, acercou-lhe e o abraçou tão fortemente que parecia sentir ali sua
própria alma, eterna e jovem.
Fevereiro/2015.
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