QUADRAS SOLTAS
Pra
mentira ser segura
E atingir
profundidade,
Tem que
trazer à mistura
Qualquer
coisa de verdade.
O rato
mete o focinho
Sem pensar
que faz asneira
Depois, ou
larga o toucinho,
Ou fica na
ratoeira.
Há pessoas
muito altas
De nome
ilustrado e sério
Porque o
oiro tapa as faltas
Da moral e
do critério.
Enquanto o
homem pensar
Que vale
mais que outro homem,
São como
os cães a ladrar,
Não deixam
comer, nem comem.
Quantas
sedas aí vão,
Quantos
brancos colarinhos,
São
pedacinhos de pão,
Roubados
aos pobrezinhos!
Sem que o
discurso eu pedisse,
Ele falou;
e eu escutei.
Gostei do
que ele não disse;
Do que
disse não gostei.
GLOSAS
Morre o
pobre e nem caixão
Vai no
esquife, que desgraça!
Para o
cemitério passa
Sem padre
nem sacristão!...
Quem fará
esta exceção?...
Se é Deus
que rege os destinos
Dos
grandes e pequeninos,
E todos
são filhos seus...
Pra
desmentir esse Deus,
Morre o
rico, dobram sinos.
Diz,
padre, que leis são essas
Que servem
pra ti somente...
Tu
confessas toda a gente
E à gente
não te confessas...
Diz por
que tanto te interessas
Nesses
segredos que encobres,
Porque é
que não te descobres
Nos
jornais ou num sermão,
Dizendo
porque razão
Morre o
pobre e não há dobres?
Só os
ricos são gerados,
Dessa
Virgem, desse Deus?...
Só eles
são filhos seus
E os
pobres são enteados?...
Padre, tu
só tens cuidados
Com os
ricos, teus compadres,
Que deixam
ir as comadres
Esmolinhas
oferecer
A Deus,
sem ninguém saber...
Que Deus é
esse dos Padres?...
Qual é o
Deus que autoriza,
Ao rico,
mil esplendores,
E aos
pobres trabalhadores,
Nem pão,
nem lar, nem camisa?...
Manda, pra
quem não precisa,
O oiro, a
prata e os cobres,
Palácios,
honras de nobres!...
E eu,
triste farrapo humano,
Julgo esse
Deus um tirano,
Que não
faz caso dos pobres
SAUDADES
Saudades
de amor, são penas
Que nascem
do coração...
E como as
penas das aves,
Quantas
mais, mais brandas são!
Meu
coração fez um ninho
Como o das
aves perfeito,
Juntando
todas as penas
De que ele
me encheu o peito...
E nesse
ninho, a sonhar
Dorme,
assim, horas serenas,
Como dorme
um passarinho
Sobre o
seu ninho de penas.
DESENCANTO
Teus
olhos, cuja luz
Já me
envolveu d'amor o coração
E doirou
minha cruz
Do seu
divino e mágico clarão...
Teus
olhos, cuja graça
Já em
risos passou por sobre mim,
Como pelo
ermo passa
A Luz a
desfolhar-se, - alvo jasmim...
Teus
olhos, cujo pranto
Por mim já
derramaste, quando ausente,
Cheia de
dor e encanto,
Choravas
de saudade, aflitamente...
Teus
olhos, esses sóis
que eu
adorava como o persa adora
O sol
entre arrebois...
- O meu
Norte, o meu Dia, a minha Aurora!
Teus
olhos... porque os vi
Fitando
uns outros que não são os meus,
De todo os
esqueci...
E assim
manchaste tu esses dois céus!...
SONETO
Tão triste
eu ando já, e descontente,
Que meus
olhos de todo se fecharam
A visão
radiosa que sonharam...
- Um lar,
um ninho, e um amor ardente...
Gastei a
Mocidade loucamente,
E a alma,
ou a perdi, ou m'alevaram,
Enquanto a
delirar juntos andaram
Cantando
amores, coração e mente...
E andando
assim da Fé tão apartado,
E tão
sozinho nesta solidão
De quem
descrente vive do que amou.
Sou qual
um tú'mlo vazio e abandonado,
só
encerrando a mesma escuridão...
Sepulcro de mim próprio, eis o que sou.
Sepulcro de mim próprio, eis o que sou.
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Fonte
"Toda a Poesia: Antologia Poética". Poeteiro Editor Digital. São Paulo, 2015.
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