O SAL
E A ÁGUA
Um
rei tinha três filhas; perguntou a cada uma delas por sua vez, qual era a mais
sua amiga. A mais velha respondeu:
–
Quero mais a meu pai, do que à luz do Sol.
Respondeu
a do meio:
–
Gosto mais de meu pai do que de mim mesma.
A
mais moça respondeu:
–
Quero-lhe tanto, como a comida quer o sal.
O rei
entendeu por isto que a filha mais nova o não amava tanto como as outras, e
pô-la fora do palácio. Ela foi muito
triste por esse mundo, e chegou ao palácio de um rei, e aí se ofereceu para ser cozinheira. Um dia veio à mesa um
pastel muito bem feito, e o rei ao parti-lo achou dentro um anel muito pequeno, e de grande
preço. Perguntou a todas as damas da corte de quem seria aquele anel. Todas quiseram ver se
o anel lhes servia: foi passando, até que foi chamada a cozinheira, e só a ela é que o anel
servia. O príncipe viu isto e ficou logo apaixonado por ela, pensando que era de
família de nobreza.
Começou
então a espreitá-la, porque ela só cozinhava às escondidas, e viu-a vestida com
trajos de princesa. Foi chamar o rei seu
pai e ambos viram o caso. O rei deu licença ao filho para casar com ela, mas a menina tirou por
condição que queria cozinhar pela sua mão o jantar do dia da boda. Para as festas de
noivado convidou-se o rei que tinha três filhas, e que pusera fora de casa a mais nova. A princesa
cozinhou o jantar, mas nos manjares que haviam de ser postos ao rei seu pai não botou sal de
propósito. Todos comiam com vontade, mas só o rei convidado é que não comia. Por fim
perguntou-lhe o dono da casa, porque é que o rei não comia? Respondeu ele, não sabendo que assistia
ao casamento da filha:
– É
porque a comida não tem sal.
O pai
do noivo fingiu-se raivoso, e mandou que a cozinheira viesse ali dizer porque é
que não tinha botado sal na comida. Veio
então a menina vestida de princesa, mas assim que o pai a viu, conheceu-a logo, e confessou ali a sua
culpa, por não ter percebido quanto era amado por sua filha, que lhe tinha dito, que lhe queria
tanto como a comida quer o sal, e que depois de sofrer tanto nunca se queixara da injustiça de
seu pai.
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Nota:Teófilo Braga: "Contos Tradicionais do Povo Português" (1883)
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