domingo, 15 de setembro de 2013

João Marques de Carvalho: "O Pároco da Aldeia"

O PÁROCO DA ALDEIA
(Poemetos em prosa)
Ao Padre Dr. Leorne Menescal

É a providencia da pobre aldeia aquele jovem sacerdote de tez morena e olhar carinhoso como um conselho de Jesus.

A sua parca mesa está sempre ás ordens dos mendigos, a sua porta aberta sempre aos viajantes, a sua boca incessantemente murmura consolações ás pessoas que sofrem.

Muitas vezes, alta noite, vão chamá-lo para ministrar os socorros da religião a algum enfermo, em qualquer das aldeias que formam a serrana freguesia. Então, levanta-se ás pressas, monta a cavalo e lá vai montanhas fora, a galope, ladeando tenebrosos precipícios, sob a chuva, tiritando de frio, impassível como um herói e contente consigo mesmo, sentindo-se alegre por ir cumprir um dos misteres que lhe impõe a sua profissão, tão bem compreendida por sua bela alma!

Nada o assusta, nada o intimida, pois tem a certeza de que todos aqueles montanheses simplórios amam-no sinceros e respeitam-lhe os conselhos de paz e bondade.

Quando começou o movimento abolicionista na Fortaleza, o reto sacerdote arvorou-se em defensor dos escravizados na sua modesta paróquia da serra de Baturité. Em poucos meses, graças a seus esforços e á ilimitada simpatia que a todos inspira, as aldeias sob o seu vicariato não tinham um ser cativo: todos eram iguais!

Quando sai de casa, encaminhando-se á pequena igreja, cuja torre branca de neve lança-se para o firmamento no alto de verdejante colina, as criancinhas, que brincam ás portas das casas, acodem a beijar-lhe a mão e as mães saúdam-no respeitosas, balbuciando uma benção....

Aos domingos, á prédica do Evangelho, vi-o, por diferentes ocasiões, fazer com a unção de sua palavra, que as lágrimas borbulhassem nos olhos dos assistentes. Domina-os a todos com o seu irrepreensível modo de viver, fertilíssimo em bons exemplos.

Nada possui: dá tudo aos necessitados, sem ostentação, naturalmente!

Ah! bendito sejas tu, Providencia da pobre aldeia, ó caritativo sacerdote de tez morena e olhar carinhoso como um conselho de Jesus!....

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Nota:
João Marques de Carvalho: "Contos Paraenses" (1889)

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