CREPUSCULAR
Poente no
meu jardim... O olhar profundo
Alongo
sobre as árvores vazias,
Essas em
cujo espírito infecundo
Soluçam
silenciosas agonias.
Assim
estéreis, mansas e sombrias,
Sugerem à
emoção em que as circundo
Todas as
dolorosas utopias
De todos
os filósofos do mundo.
Sugerem...
Seus destinos são vizinhos:
Ambas, não
dando frutos, abrem ninhos
Ao
viandante exânime que as olhe.
Ninhos,
onde vencida de fadiga,
A alma
ingênua dos pássaros se abriga
E a
tristeza dos homens se recolhe...
PLATÔNICO
As idéias
são seres superiores,
— Almas
recônditas de sensitivas —
Cheias de
intimidades fugitivas,
De
crepúsculos, melindres e pudores.
Por onde
andares e por onde fores,
Cuidado
com essas flores pensativas,
Que tem
pólen, perfumes, órgãos e cores
E sofrem
mais que as outras cousas vivas.
Colhe-as
na solidão... são obras-primas
Que vieram
de outros tempos e outros climas
Para os
jardins de tua alma que transponho,
Para com
ela teceres, na subida,
A coroa
votiva do teu Sonho
E a
legenda imperial da tua Vida.
ARTISTA
Por um
destino acima do teu Ser,
Tens que
buscar nas coisas inconscientes
Um sentido
harmonioso, o alto prazer
Que se
esconde entre as formas aparentes.
Sempre o
achas, mas ao tê-lo em teu poder
Nem no
pões na tua alma, nem no sentes
Na tua
vida, e o levas, sem saber,
Ao sonho
de outras almas diferentes...
Vives
humilde e inda ao morrer ignoras
O Ideal
que achaste... (Ingratidão das musas!)
Mas não
faz mal, meu bômbix inocente:
Fia na
primavera, entre as amoras.
A tua seda
de ouro, que nem usas
Mas que
faz tanto bem a tanta gente...
CRISTIANISMO
Sonho um
cristianismo singular
Cheio de
amor divino e de prazer humano;
O Horto de
Mágoas sob um céu virgiliano,
A
beatitude com mais luz e com mais ar...
Um pequeno
mosteiro em meio de um pomar,
Entre
loureiros-rosa e vinhas de todo o ano.
Num
misticismo lírico, a sonhar
Na orla
florida e azul de um lago italiano...
Um
cristianismo sem renúncia e sem martírios,
Sem a
pureza melancólica dos lírios.
Temperado
na graça natural...
Cristianismo
de bom humor, que não existe,
Onde a
Tristeza fosse um pecado venial,
Onde a
Virtude não precisasse ser triste...
IRONIA!
Ironia!
Ironia!
Minha
consolação! Minha filosofia!
Imponderável
máscara discreta
Dessa
infinita dúvida secreta,
Que é a
tragédia recôndita do ser!
Muita
gente não te há de compreender
E dirá que
és renúncia e covardia!
Ironia!
Ironia!
És a minha
atitude comovida:
O
amor-próprio do Espírito, sorrindo!
O pudor da
Razão diante da Vida!
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Fonte
"Toda a Poesia: Antologia Poética". Poeteiro Editor Digital. São Paulo, 2015.
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