(PRE) TEXTO
Certas palavras
mais do que
sentido,
sentem.
Rebelam-se
contra o impingido
e retornam às
raízes
de um significado
perdido.
Nascem poema
e se extraviam na
prosa.
Florescem nos
passos
e se desfazem nos
rastros.
Fulgem no rizoma
e se apagam na
copada.
Urge ajudá-Ias
em sua volta
sofrida
à flor da pele
de quem as
pronuncia.
MARIAS
Marina Maria e la
Parisô
Clara Maria e Pia
Maria
Mariana ou
Marialba ou Mary Lô
a de sobrenome
Saudade
e até Marias sem
nome.
Tecem-se e
destecem-se
Em minhas noites
insones
Rarefeitas,
esgarçadas.
Como nuvens,
perfeitas.
Quando elas
estavam
Quem faltava era
eu.
Agora que estou
são elas que se
foram.
AS QUATRO ESTAÇÕES NUM PAÍS DO NORTE
PRIMAVERA
A madrugada
deslizou no
espelho
de um lago
(havia cisnes
entre brumas).
Melros cantaram
em cheio
no vazio
crepuscular
de meus passos.
Foi quando
sem ter dormido
amanheci.
VERÃO
O dia se alonga
claro, sem
descanso
e o lusco-fusco
em fúria de branco
madruga insidioso.
Transfigura a
noite
que se omite.
OUTONO
Lenta melancolia
de folhas rubras
tinge os dias,
embala as noites.
Desprendem-se nos
ares
seivas e humores.
Espíritos se
evolam
das raízes mortas.
O vento bate
às portas de quem
somos
num silvo
insistente.
Ninguém atende.
INVERNO
Medram sementes
em frinchas de
gelo.
Ressonam trigais
em campos
sombrios.
Sonham pardais
em estalactites
de beirais
arredios.
Sob a neve
tranquila, imóvel
a vida se faz
saudade
do que já foi e é
nada.
O mundo descansa,
a seiva hiberna.
Fermentam-se
vinhos
das dores
passadas.
Nesse sono fecundo
quem almejaria
ainda
sofrer futuro?
ONDE ANTES NASCIA A LUA
Por trás do
rendilhado verdejante
onde antes
a lua pastoreava
seus viventes
horda furiosa
armada até os
dentes
avança e resseca
a sementeira das
nascentes
e faz da lua
exangue
um destroço
que se joga fora
AUTORRETRATO
Se não se pode ter
tudo
se o todo é defeso
tenha-se ao menos
o pouco que restou
no poço do
esquecimento
e vive, além da
morte
de cada instante.
Mazelas e querelas
corroeram o corpo
que encolheu,
minguou
mas a alma
sobreviveu
a si mesma
nos olhos que
soletram
o que nunca teve
ou se perdeu.
---
Fonte:
Revista Brasileira: Fase VIII - Abril-Maio-Junho 2012 - Ano I - Nº 71
Nenhum comentário:
Postar um comentário