A UM MENINO
Na maciez do alvo
braço,
De tua mãe no
regaço
Dormes, infante, a
sonhar;
Teu sonho é
plácido e liso
Que um angélico
sorriso
Te vem nos lábios
pairar.
Dormiste aos
beijos maternos;
Entre carinhos tão
ternos
Como é doce o teu
dormir!
Quando acordares
sorrindo,
Verás o semblante
lindo
De tua mãe a
sorrir.
Dorme em sossego,
menino,
Pois no livro do
destino
Tens um destino
feliz,
Dorme em completo
abandono,
Dourado seja o teu
sono
Dos sonhos pelo
matiz.
LÁGRIMAS E AMORES
Quando no espaço
bruxoleia a aurora,
Mandando à terra
divinais palores,
O doce orvalho,
que nos campos chora,
São lágrimas e
amores.
Nas frescas
tardes, nas manhãs de maio,
Que aqui renascem,
que ali brotam flores,
Quando chorarem, o
seu pranto amai-o,
São lágrimas e
amores.
Amai-o; as flores
também têm segredos,
Sim, vivem,
morrem, têm sorriso e dores;
Vede esse pranto,
decifrai enredos,
São lágrimas e
amores.
Quando, transpondo
do horizonte a corda,
O sol se despe dos
gentis fulgores,
Brancas estrelas
de que o céu se borda,
São lágrimas e
amores.
Quando na campa,
que o cipreste esguio
Com a sombra cobre
de enlutadas cores,
Chorarem brisas,
que acordou o estio,
São lágrimas e
amores.
Quando o arco-íris
lá no céu se arqueia;
Para, chovendo,
refecer calores,
Esses gotejos por
que o sol anseia,
São lágrimas e
amores.
Quando, por noites
de luar ameno,
O céu se esmalta
de cem mil primores,
Esses rorejos do
sutil sereno
São lágrimas e
amores.
Quando branquejam,
de manhã, neblinas,
Cobrindo os
campos, o que são? – vapores,
Que o pranto gera
das canções divinas,
São lágrimas e
amores.
Cristáleas águas,
que o Amazona atira
Nas nossas terras
a trajar verdores,
E os sons
cadentes, que eu na mata ouvira,
São lágrimas e
amores.
As níveas pérolas
de nitente alvura,
Que a fonte clara
salpicou nas flores,
Serão segredos de
amorosa jura?
São lágrimas e
amores.
ESCUTA
Se para amar-te
for mister martírios,
Com que delírios
saberei sofrer!
Se de altas
glórias for mister a palma,
Talvez minha alma
possa além colher.
Quebrar cadeias,
conquistar um nome,
Que não consome o
perpassar das eras;
Arcar com a fúria
de iracundos nortes,
Sofrer mil mortes,
sem morrer deveras;
Nas próprias
carnes apertar cilícios,
Nos sacrifícios
ter sereno o rosto;
Pisar descalço
sobre espinhos duros,
Com pés seguros,
com sinais de gosto;
Longe da pátria,
no país mais feio,
De tédio em meio,
para amar-te, irei
Viver embora sob a
zona ardente,
E ali contente por
te amar serei!...
E a ser amado, se
é mister o incenso,
Que sobe denso dos
salões aos tetos;
Serei altivo, mas
não vou de rastos,
Com lábios castos
mendigar agetos!
E se me odeias,
por não ir-me às salas
Dizer-te as falas
de mendaz paixão,
E, aos olhos de
outros, profanando extremos,
Dizer-te: amemos,
e apertar-te a mão;
Me odeia, e muito, que eu não sou da farsa,
Que o mal
disfarça, que desfruta e ri!
Me odeia, e
sempre, que eu não desço ao nível
Do pó terrível,
que se arraste aí!
Dá-me o teu ódio,
pois não quero – escuta –
Beber cicuta,
procurando mel,
Dá-me o teu ódio,
mas num grau subido,
Embora ungido de
amargoso fel!
Dá-me o teu ódio
por fatal sentença
A indiferença me
será pior.
Que um sentimento
por mim sintas n’alma,
Dá-me essa palma
de um sofrer melhor!
PARA O ÁLBUM DE UMA SENHORA
Fora inútil pedir
mimos à dália,
Perfumes ao
jasmim, nos céus da Itália
Da mais nítida
estrela a luz buscar.
Fora inútil trazer
incenso arábio,
Ou sorrir divinal
de fresco lábio
Das mimosas
gentis, netas de Agar.
Fora inútil na
página, que escrevo,
Veroneso traçar
sutil relevo,
Pintando imagens
de celeste alvor.
À Golconda pedir
belo diamante,
E um lindo verso,
que escrevera o Dante,
Fora inútil buscar
e aqui depor.
Fora inútil pedir
às Sorrentinas
Uma nota sequer
das cavatinas,
Que elas cantam de
amor, meu Deus, tão bem!
Que eu deponho-te
aqui maior tesouro,
Que as riquezas de
ofir, que o próprio ouro,
Que o rico solo do
Brasil contém.
E o tesouro, hás
de ver, é um nome santo,
Como dos olhos
maternais um pranto,
Nas horas de
partir, valendo o adeus.
Tão doce como as
moles serenatas,
Como o som
murmurante das cascatas,
Ou qual prece
infantil, que sobe a Deus.
E esse nome, hás
de ver, mais puro e belo,
Que do insonte
cordeiro o branco velo,
Dos sacrifícios,
que na Bíblia eu li,
É doce como o
cântico de uma ave,
Mais doce que do
Himeto o mel suave
Em taça de ouro da
mais linda huri.
E esse nome, hás
de ver, tem mais poesia,
Que os sons
acordes, que David tangia,
Quebrando as iras
do feroz Saul.
Mais belo do que o
sol dourando os bosques,
Do que a lua a
bater sobre os quiosques
Da soberba e
gentil, mole Istambul.
E esse nome
apurado em mil aromas,
Que recenderam das
ambrósias comas
Da virgem, que por
mãe Cristo escolheu:
Esse nome melhor
que um beijo helênico,
Mais mimoso e
melhor que um riso edênico,
Esse nome, Maria,
é o nome teu!
AS FLORES DAS LARANJA
Cada flor tem de
certo vária sorte,
Tem diverso
condão:
Há flores para
ávida e para a morte,
Que dizem sim, ou
não.
Há flores para as
mágoas da ansiedade,
Para os sonhos de
amor,
Há flores para as
cismas da saudade,
Há também para a
dor.
Há flores que só
vingam no chão frio
Da fria sepultura,
Borrifadas das
lágrimas a fio,
Que chora a
desventura.
Há flores que só
crescem no retiro
De amiga solidão;
Uma flor diz um
aí, outra um suspiro,
Todas têm seu
condão.
Esta vai perfumar
as lindas jarras
Dos altares
radiantes;
Aquela ser de amor
propícias arras
No peito dos
amantes.
Ali – campeia
altiva uma fronte
Do bravo que
venceu;
Acolá – sobre a
face bela, insonte,
Da virgem que
morreu
Além – sobre os
degraus do capitólio,
Nos penetrais da
glória;
Aquém – cobrindo o
desditoso espólio,
De um gênio, e a
sua história!
Cada flor tem de
certo vária sorte,
Tem diverso
condão:
Há flores para a
vida e para a morte,
Que dizem sim, ou
não.
Mas de todas as
flores mais felizes
As que têm melhor
sina,
Não são as rosas,
nem jasmins, nem lises,
Nem dálias, nem
bonina.
As flores de
laranja mais ditosas
Que as outras
flores são:
Têm mais poesia,
têm! São mais cheirosas,
Tem mais
inspiração!
As flores de
laranja se entrelaçam,
Na virginal
capela!
De perfume
suavíssimo repassam
O seio da donzela!
Das essências de
amor sublime extrato,
Sublime é o condão
seu:
Fê-las Deus para
honrar o doce pacto
Do sagrado
himeneu.
Por isso eu amo a
flor de laranjeira
Da donzela na
coma,
Ou então quando a
brisa passageira
Me traz seu doce
aroma.
Amo a flor de
laranja, quando a avisto
Num seio de
mulher!
Quando a noite me
toma de imprevisto,
ou d’alva o
rosicler.
Amo-a, quando a
donzela meiga a esfolha
em pura distração,
Ou com o pranto dos olhos seus a molha,
abrindo o coração.
No teu álbum,
portanto, eu quis as flores
De laranja depor:
Síntese bela de
ideais amores,
Dos amores a flor.
E a tua mão,
formosa Terezinha,
Que mil graças
esbanja,
Aceite a triste, a
pobre oferta minha
De flores de
laranja
Fonte
"Toda a Poesia: Antologia Poética". Poeteiro Editor Digital. São Paulo, 2015.
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