O GALO E A PÉROLA
Num
monturo, engravatando,
Formoso
galo aguerrido
Acha uma
pérola fina
Qu'havia
um nobre perdido.
Por três
vezes a escoucinha
Sem nela
querer pegar;
À quarta,
erguendo-a no bico,
Se põe a
cacarejar.
Vêm logo
algumas galinhas
Cuidando
qu'era algum grão;
Mas vendo
a pérola, tristes
Vão-se,
deixando-a no chão.
Acaso
passa um ourives,
E,
apanhando-a, alegre diz:
"É
uma pérola fina!
Que belo
achado que fiz!"
"Homem",
lhe pergunta o galo,
"Tanto
essa joia merece?
Pois eu,
por um grão de milho
Te dera
mil, se as tivesse".
Pérola em
poder de galo,
Que lhe
não sabe o valor,
É como
entre as mãos dum néscio
As obras
de um sábio autor.
A LEBRE E A TARTARUGA
(FÁBULA)
“Apostemos,
disse à lebre
A
tartaruga matreira,
Que eu
chego primeiro ao alvo
Do que tu,
que és tão ligeira!”
Dado o
sinal da partida,
Estando as
duas a par,
A
tartaruga começa
Lentamente
a caminhar.
A lebre
tendo vergonha
De correr
diante dela,
Tratando
uma tal vitória
De peta ou
de bagatela,
Deita-se,
e dorme o seu pouco;
Ergue-se,
e põe-se a observar
De que
parte corre o vento,
E depois
entra a pastar;
Eis deita
uma vista de olhos
Sobre a
caminhante sorna,
Inda a vê
longe da meta,
E a pastar
de novo torna.
Olha; e
depois que a vê perto,
Começa a sua
carreira;
Mas então
apressa os passos
A
tartaruga matreira.
À meta
chega primeiro,
Apanha o
prêmio apressada,
Pregando à
lebre vencida
Uma grande
surriada.
Não basta
só haver posses
Para obter
o que intentamos;
É preciso
pôr-lhe os meios,
Quando
não, atrás ficamos.
O
contendor não desprezes
Por fraco,
se te investir;
Porque um
anão acordado
Mata um
gigante a dormir.
MORREU BOCAGE, SEPULTOU-SE EM GOA
Morreu
Bocage, sepultou-se em Goa!
Chorai,
moças venais, chorai, pedantes,
O insulso
estragador dos consoantes.
Que tantos
tempos aturdiu Lisboa!
Por
aventuras mil obteve a c′roa
Que a
fronte cinge dos heróis andantes;
Inda veio
de climas tão distantes
Á toa
vegetar, versar á toa:
Este que
vês, com olhos macerados,
Não é
Bocage, não, rei dos brejeiros.
São apenas
seus olhos descarnados:
Fugiu do
cemitério aos companheiros;
Anda agora
purgando seus pecados
Glosando aos cagaçais pelos outeiros.
Glosando aos cagaçais pelos outeiros.
O VELHO, O RAPAZ E O BURRO
Tenha ou não tenha
razão,
Vou contar-vos uma
história,
Em prova desta
asserção.
Partia um velho
campônio,
Do seu monte ao
povoado,
Levava um neto que
tinha
No seu burrinho
montado.
Encontra uns
homens que dizem
"Olha aquela
que tal é!
Montado o rapaz
que é forte,
E o velho trôpego
a pé".
"Tapemos a
boca ao mundo",
disse o velho:
"Rapaz,
Desce do burro
qu'eu monto,
E vem caminhado
atrás".
Monta-se ,mas ouve
dizer:
"Que patetice
tão rata!
O tamanhão de
burrinho
E o pobre pequeno
à pata!"
"Eu me
apeio!" diz prudente,
o velho de boa fé.
"Vá o burro
sem carrego
E vamos ambos a
pé!"
Apeiam-se e outros
dizem
"Toleirões,
calcando lama,
De que lhes serve
o burrinho?
Dormem com ele na
cama?"
"Rapaz",
diz o bom do velho,
Se de irmos a pé
murmuram
Ambos montemos no
burro
A ver se inda nos
censuram".
Montam, mas ouvem
de um lado
"apeiem-se
almas de breu!
Querem matar o
burrinho,
Aposto que não é
seu?"
"Vamos ao
chão" diz o velho,
que já não sei o
que fazer!
O mundo está de
tal sorte,
que não se pode entender.
É mau se monto no
burro,
Se monta o rapaz,
mau é.
Se ambos montamos
é mau,
É mau se vamos a
pé:
De tudo nos têm
ralhado,
Agora que mais nos
resta?
Peguemos no burro
às costas,
Façamos ainda mais
esta!"
Pegam no burro: o
bom velho
Pelas mãos o ergue
do chão:
Pega-lhe o rapaz
nas pernas
E assim caminhando
vão.
"Olhem dois
loucos varridos!"
Ouvem com grande
sussurro.
"Fazendo o
mundo às avessas,
tornados burros do
burro!"
O velho, então,
pára e exclama,
"Do que
observo me confundo,
Por mais qu'a
gente se mate,
Nunca tapa a boca
ao mundo!
Rapaz, vamos com
dantes,
Sirvam-nos estas
lições!
É mais que tolo
quem dá
Ao mundo
satisfações".
MACARRÃO
É grosso, longo e
furado,
Pinga mas não se derrete,
Enxuto e duro se mete, Tira-se mole e molhado;
É à cobra assimilhado,
Mas tem seu quê com a espiga;
Penetra até à barriga,
Sacia a vontade à gente;
Porém ser cousa indecente,
Não se creia nem se diga.
Pinga mas não se derrete,
Enxuto e duro se mete, Tira-se mole e molhado;
É à cobra assimilhado,
Mas tem seu quê com a espiga;
Penetra até à barriga,
Sacia a vontade à gente;
Porém ser cousa indecente,
Não se creia nem se diga.
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Fonte
"Toda a Poesia: Antologia Poética". Poeteiro Editor Digital. São Paulo, 2015.
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