CABELOS BRANCOS
Cobrem-me as
fontes já cabelos brancos,
Não vou a festas.
E não vou, não vou.
Vou para a aldeia,
com os meus tamancos,
Cuidar das hortas.
E não vou, não vou.
Cabelos brancos,
vá, sejamos francos,
Minha inocência
quando os encontrou
Era um mistério
vê-los: Tive espantos
Quando os achei,
menino, em meu avô.
Nem caiu neve, nem
vieram gelos:
Com a estranheza ingênua da mudança,
Castanhos remirava
os meus cabelos;
E, atento à cor,
sem ter outra lembrança,
Ruços cabelos me
doía vê-los ...
E fiquei sempre
triste de criança.
HORAS DE SAUDADE
Vou de luar em
rosto, descontente:
Meus olhos choram
lágrimas de sal.
— Adeus, terras e
moças do casal,
— Adeus, ó coração
da minha gente.
A hora da saudade
é uma serpente:
Quero falar, não
posso, e antes que fale
Ela enlaça-me a
voz tão cordial
Que as coisas mais
me lembram fielmente.
Olhos de amora, e
uma ave na garganta
Para enfeitiçar a
alma quando canta,
Moças com sua
parra de avental;
Graça, Beleza, um
verso sem medida,
A Saudade
desterrou-me a vida ...
RISO
Tive o jeito de
rir, quando menino,
Até beber as
lágrimas choradas:
Com carantonhas,
gestos, desatino,
Passou a nuvem e
os pequenos nadas.
A rir de
escuridões, de encruzilhadas,
Tornei-me afeito
logo em pequenino;
Porque ri é que
trago as mãos geladas,
E choro porque ri
do meu destino.
Vivi de mais num
mundo idealizado
Comigo só: E só de
mim descreio
Entornava-me riso
a luz em cheio
Quando o meu mundo
foi principiado;
Rio agora que não
sei donde me veio
Sempre o mal que
me trouxe o bem sonhado.
AMOR
Por teu ventre
começa a minha vida,
Por teus olhos a
estrela que me guia.
Amor, que Deus te
salve! — Ave-Maria
Cheia de Graça ó
Bem-Aparecida.
Por meu e por teu
verbo de harmonia
Se fará eterna
origem comovida
De outros frutos
de Amor! — Ave-Maria,
Senhora da
minh'alma apetecida.
E meu sangue
amoroso e produtivo
Se fará carne e
espírito fecundo
À tua imagem
noutro corpo vivo.
E assim ambos,
Amor, iremos ser
Seio da vida
originando o mundo
Por teu ventre
bendito de Mulher.
HORA MÍSTICA
Noite caindo ...
Céu de fogo e flores.
Voz de Crepúsculo
exalando cores,
O céu vai cheio de
Deus e de harmonia.
Silêncio ...
Eis-me rezando aos fins do dia.
Névoa de luz
criando imagens na água,
Nome das águas
esculpindo os céus,
Tarde aos relevos úmidos de frágua,
Boca da noite,
eis-me rezando a Deus.
Eis-me entoando, a
voz de cinza e ouro,
— Oh, cores na
água vindo às mãos em branco! —
Minha ópera de Sol
ao último arranco.
E, oh! hora mística
em que o olhar abraso,
— Sol expirando
aos Pórticos do Ocaso! —
Dobra em meu peito
um oceano em coro.
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