POEMA NATURAL
Abro os olhos, não
vi nada
Fecho os olhos, já
vi tudo.
O meu mundo é
muito grande
E tudo que penso
acontece.
Aquela nuvem lá em
cima?
Eu estou lá,
Ela sou eu.
Ontem com aquele
calor
Eu subi, me
condensei
E, se o calor
aumentar, choverá e cairei.
Abro os olhos,
vejo um mar,
Fecho os olhos e
já sei.
Aquela alga
boiando, à procura de uma pedra?
Eu estou lá,
Ela sou eu.
Cansei do fundo do
mar, subi, me desamparei.
Quando a maré
baixar, na areia secarei,
Mais tarde em pó
tomarei.
Abro os olhos novamente
E vejo a grande
montanha,
Fecho os olhos e
comento:
Aquela pedra
dormindo, parada dentro do tempo,
Recebendo sol e
chuva, desmanchando-se ao vento?
Eu estou lá,
Ela sou eu.
CEMITÉRIO ADALGISA
Moram em mim
Fundos de mares,
estrelas-d'alva,
Ilhas, esqueletos
de animais,
Nuvens que não
couberam no céu,
Razões mortas,
perdões, condenações,
Gestos de amparo
incompleto,
O desejo do meu
sexo
E a vontade de
atingir a perfeição.
Adolescências
cortadas, velhices demoradas,
Os braços de Abel
e as pernas de Caim.
Sinto que não
moro.
Sou morada pelas
coisas como a terra das sepulturas
É habitada pelos
corpos.
Moram em mim
Gerações, alegrias
em embrião,
Vagos pensamentos
de perdão.
Como na terra das
sepulturas
Mora em mim o
fruto podre,
Que a semente
fecunda repetindo a vida
No sereno ritmo da
Origem.
Vida e morte,
Terra e céu,
Podridão,
germinação,
Destruição e
criação.
ESTIGMA
Não receio que
partas para longe,
Que faças por
fugir, por te livrares
Da força da minha
voz
E da compreensão
do meu olhar.
Não temo que os
mares te levem
No bojo dos
transatlânticos
Nem tampouco me
amedronta
Que em possantes
aviões
No céu e na terra,
Em todos os seres
me encontrarás
Cortes espaços sem
conta.
Serena ficarei se
disseres
Que na certa me
olvidarás
No ventre da mata
virgem,
Nas areias dos
desertos
Ou no amor de
outras mulheres que terás.
Não importa.
Nada temo e desejo
mesmo que o faças
Para que saibas o
quanto estou em teus sentidos
E que a minha
forma, o meu espírito
Jamais da tua existência
passa.
Se fugires pelos
mares
Tu me veras na
espuma leve da onda,
Me sentiras no
colorido de um peixe
E a minha voz
escutaras dentro de uma concha.
Se partires pelos
ares,
Certamente na
brancura de uma nuvem
Tu sentirás a
maciez e a alvura
Das minhas carnes.
Se fores para a
floresta
Hás de me ver
Na árvore mais
florida e harmoniosa
Atravessando
areias cálidas do deserto.
Sei que trocarias
o lenitivo de um oásis
Pela certeza de me
teres perto.
E nas mulheres que
encontrares,
Dos seios o perfume,
das nucas a palidez,
Das ancas as
curvas
E das peles a cor
e a tepidez,
Fica certo, não te
evadirás.
Porque desde a tua
sombra
Ao teu mais rápido
pensamento
Não serás livre de
mim
Num um momento.
POEMA DA AMANTE
Eu te amo
Antes e depois de
todos os acontecimentos,
Na profunda
imensidade do vazio
E a cada lágrima
dos meus pensamentos.
Eu te amo
Em todos os ventos
que cantam,
Em todas as
sombras que choram,
Na extensão
infinita dos tempos
Até a região onde
os silêncios moram.
Eu te amo
Em todas as
transformações da vida,
Em todos os
caminhos do medo,
Na angústia da
vontade perdida
E na dor que se
veste em segredo.
Eu te amo
Em tudo que estás
presente,
No olhar dos
astros que te alcançam
E em tudo que
ainda estás ausente.
Eu te amo
Desde a criação
das águas,
desde a idéia do
fogo
E antes do
primeiro riso e da primeira mágoa.
Eu te amo
perdidamente
Desde a grande
nebulosa
Até depois que o
universo cair sobre mim
Suavemente.
POESIA ENTRE O CAIS E O HOSPITAL
Geme no cais o
navio cargueiro
No hospital ao
lado, o homem enfermo.
O vento da noite
recolhe gemidos
Une angústias do
mundo ermo.
Maresia transborda
do mar em cansaço,
Odor de remédios
inunda o espaço.
Máquina e homem,
ambos exaustos
Um, pela carga que
pesa em seu bojo
Outro, na dor
tomando o seu corpo.
Cais, hospital:
Portos de espera
E começo de fim da
longa viagem.
Chaminés de
cargueiros gritando no mar,
Garganta do homem
em gemidos no ar.
No fundo, o
universo,
O mar infinito,
O céu infinito,
O espírito infinito.
Neblinados em
tristezas e medos
Surgem silêncios
entre os rochedos.
Chaminés de
cargueiros gritando no mar
E a garganta do
homem em gemidos no ar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário