ÔNIBUS
Vem atulhado de
gente,
vai atulhado de
gente,
gente que vai
trabalhar,
gente que parte
cansada,
gente que volta
cansada
de um incurável
cansaço.
Ônibus que é para
todos
os que não podem
parar
Ônibus de velhos,
moços,
mulheres, meninos,
crianças,
estudantes e
pedreiros,
pintores e
professores,
mecânicos e
bombeiros
enfumaçados e
tristes
a dormir durante a
viagem.
Dormem, mas dormem
que sono?
Dormem sonhando
que sonhos?
Sonhos de amor ou
de guerra?
No espaço ou no
chão de terra?
Ai! daqueles que
não dormem
e não têm sonho
nenhum
no estreito aperto
dos bancos
ou de pé aos
solavancos
dentro do ônibus
mortal
de uma vida não
vivida
em que a maior
alegria
tem um olhar de
tristeza
ri meio sorriso
triste
e não desce onde
deseja
mas onde o
trânsito quer.
Triste ônibus
desta vida.
FELICIDADE
Felicidade - o
título tão comprido deste poema tão pequeno!
Felicidade -
substantivo comum, feminino, singular, polissilábico.
Tão polissilábico.
Tão singular. Tão feminino. E tão pouco comum.
Substantivo
complicado, metafísico,
que cabe todo
na beleza clara de
alguém que eu sei
e no sorriso sem
dentes de meu filho.
ÚLTIMA VIAGEM
Um dia, nada mais
terá regresso,
nem resposta, nem
eco; e punho e paz,
amor beijado em
carne ou inexpresso
serão iguais, e
não suspeitarás.
Um dia, ainda
serás somente excesso,
em alma e corpo
excesso, e apagarás
e clara vida; e o
mundo, então egresso
dos instantes de
ti, sob, ou detrás,
ou dentro do teu
gesto suspirado,
será também
desfeito e desnudado,
e morrerá no fim
da origem que és.
Não voltará, na
elíptica derrota
junto a rostos
vazios, a remota,
a funda marcha dos
teus juntos pés.
NA RUA FEIA
Na rua feia,
de casas pobres,
morreu o filhinho
daquela mulher
que lava o linho
rico
de um bairro
distante.
Morreu bem
simplesmente,
assim como um
passarinho.
O enterro
saiu...lá vai...
um caixãozinho
azul
num carro velho de
3a. classe.
Atrás dois autos.
Dois.
A tarde irá pôr
luto
na rua feia,
de casas pobres?
Garotos brincam de
esconder
atrás do muro de
cartazes.
Lá no alto
vai-se abrindo
grande céu sem mancha
cruzeiro-do-sulmente
iluminado.
SOLIDÃO
O rio se
entristece sob a ponte.
Substância de
homem na torrente escura
flui,
enternecimento ou desventura,
misturada ao
crepúsculo bifronte.
Antes que débil
lume além desponte,
a sombra, que se
apressa, desfigura
e apaga o casario
em sua alvura
e a curva esquiva
e sábia do horizonte.
Os bois fecham nos
olhos os arados,
o pasto, a hora
que tomba das subidas.
Dorme o ocaso,
pastor, entre as ovelhas.
Sobem névoas dos
vales fatigados
e das árvores já
enoitecidas
pendem silêncios
como folhas velhas.
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