O FIM DE
TODAS AS FLORES
Rosa era
seu nome. Morava na última casa de uma estreita rua da periferia da cidade.
Vivia sozinha com a mãe, viúva desde os quarenta anos, de um vendedor de
flores, com quem se casara contra a vontade dos pais e com quem tivera esta
única filha.
A moça, embora
de uma simplicidade agreste, chamava a atenção por suas formas perfeitas, pela
extrema delicadeza com que tratava a todos e, principalmente, por seu peculiar
gosto no cultivo e venda de flores. Sua casa era como um pequeno jardim, onde
acácias, anêmonas, cravos, azaleias, lírios, begônias, violetas, orquídeas,
margaridas e rosas, pareciam concorrer com sua própria beleza. Ah, quantas
flores! diziam.
No
extremo desta mesma cidade viviam dois belos e felizes mancebos, filhos de
prósperos comerciantes, ambos de igual idade e estudantes de Biologia na mesma
Universidade. Eram amigos desde a infância, morando um e outro na mesma rua,
onde cresceram juntos e onde conheceram Rosa, uma das muitas vendedoras da
famosa Feira das Flores, evento muito conhecido na cidade e que atraía a
presença de muita gente importante de toda aquela região.
- Que
flor mais bela! galanteou um.
- Que
flor mais linda! emendou o outro.
Trocaram
olhares, palavras, gracejos e telefones. Enamoraram-se dela!
A amizade
entre os dois moços era aquela que resiste aos anos e da qual se diz que apenas
a morte tem o poder de separar. Um era como se fosse a extensão do outro, tal
era a natureza do vínculo afetivo que os unia. Se fossem irmãos, diriam que
provieram da divisão de um mesmo óvulo fecundado.
A moça
manifestou-lhes gratidão e os convidou a voltarem outras vezes. Ainda acharam
tempo para falar sobre flores, plantas e outros assuntos do ramo da botânica.
Voltariam, disseram.
E
voltaram.
A partir
daí as visitas tornaram-se frequentes e a amizade entre eles criou raiz e
floresceu como as próprias flores. Da amizade frutificou também o amor, e deste
rebentou os espinhos, que fez sangrar os corações dos moços, os quais
disputavam agora a mesma flor, a mais bela flor, Rosa, a vendedora de flores. A
amizade, outrora tão cultivada entre eles, perdeu o viço, a cor e o brilho...
murchou... De amigos floridos, inimigos desfolhados.
Ela se
viu ferida entre abrolhos. Cultivava o amor de um, mas não queria eriçar de
mágoa o coração do outro. Confusa, deixou-se irrigar de tristeza, desistiu das
flores e foi vender perfumes. A casa, que antes exalava os aromas das flores,
agora cheirava a Natura.
Que fim
levaram todas as flores? perguntava a mãe, os vizinhos, os amigos...
perguntavam todos.
Triste,
recolhia-se ao seu quarto, sem flores, onde chorava, chorava muito...
Num dia
desses de lágrimas, recebeu a visita de um dos moços, aquele a quem amava. Ele
declarou-lhe amor eterno e lhe trouxe de presente uma joia valiosa que comprara
na Europa. Ela pediu que a poupasse de mais tristezas. Ele foi-se...
O tempo
passava depressa e não desabrochava nela a alegria de viver. Recolhida em seu
quarto triste e sem flores, visitou-lhe o outro numa tarde dessas de lágrimas,
o qual também lhe declarou amor eterno e lhe trouxe de presente uma flor, uma
exuberante rosa vermelha. Então os olhos dela brilharam, suas mãos tremeram e
seu coração disparou. Neste instante os seus lábios tocaram os lábios dele, e
se amaram, e construíram um jardim, e receberam flores, e plantaram flores, e
colheram flores, e venderam flores... e foram cobertos com flores.
Março/2015.
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