O VASO
Oh! o
lindo, o lindo vaso que Celina possuía! e com que carinho, com que meiguice
tratava ela as flores daquele vaso, o mais belo de toda a aldeia! Levava-o a
toda a parte: e, no seu ciúme, na sua avareza, não queria confiá-lo a ninguém,
com medo de que mãos profanas estragassem as raras flores que nele viçavam. Ela
mesma as regava, de manhã e à noite: ela mesma as catava cuidadosamente todos
os dias, para que nenhum inseto as roesse ou lhes poluísse o acetinado das
pétalas. E em toda a aldeia só se falava do vaso de Celina. Mas, a rapariga,
cada vez mais ciosa do seu tesouro, escondia-o, furtava-o às vistas de todo o
mundo. Oh! o lindo, o lindo vaso que Celina possuía!
Certa vez,
(era por ocasião das colheitas) Celina acompanhou as outras raparigas ao campo.
A manhã era esplêndida. O sol inundava de alegria e de luz a paisagem. E as
raparigas iam cantando, cantando; e as aves nas árvores, gorjeando, e as águas
do riacho nos seixos da estrada, murmurando, faziam coro com elas. E Celina
levava escondido seu vaso. Não quisera deixá-lo em casa, exposto à cobiça de
algum gatuno. E os rapazes diziam: "Aquela que ali vai é Celina, que
possui o mais belo vaso da aldeia..."
Por toda
a manhã, por toda a tarde, a faina da colheita durou. E, quando a noite desceu,
cantando e rindo as raparigas desfilaram, de volta à aldeia. Celina, sempre
retraída, sempre afastada do convívio das outras, deixou-se ficar atrasada. E,
sozinha, pela noite escura e fechada, veio trazendo o seu vaso precioso...
Dizem na
aldeia que aqueles caminhos são perigosos: há por ali, rodando nas trevas,
gênios maus que fazem mal às raparigas...
Não se
sabe o que houve: sabe-se que Celina, chegando a casa, tinha os olhos cheios de
lágrimas, e queixava-se, soluçando, de que haviam roubado as flores do seu
vaso. E não houve consolação que lhe valesse, não houve carinho que lhe
acalmasse o desespero. E os dias correram, e correram as semanas, e correram os
meses, e Celina, desesperada, chorava e sofria: "Oh! As flores! as flores
do meu vaso que me roubaram!..."
Mas, no
fim do nono mês, Celina consolou-se. Não tinha recuperado as flores perdidas...
mas tinha nos braços um pimpolho. E o João das Dornas, um rapagão que era o
terror dos pais e dos maridos, dizia à noite, na taverna, aos amigos, diante dos
canecos de vinho:
—
Ninguém roubou as flores da rapariga, ó homens! eu é que lhes fiz uma rega
abundante, por que não admito flores que estejam toda a vida sem dar frutos...
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Nota bibliográfica:
Olavo
Bilac (com o pseudônimo de Bob): "Contos para Velhos", obra
digitalizada por: NEAD – Núcleo de Educação
à Distância, da Universidade da Amazônia.
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