
MARIANA
Voltei de Europa depois de uma ausência de quinze anos. Era quanto bastava para vir achar muita coisa mudada. Alguns amigos tinham morrido, outros estavam casados, outros viúvos. Quatro ou cinco tinham-se feito homens públicos, e um deles acabava de ser ministro de Estado. Sobre todos eles pesavam quinze anos de desilusões e cansaço. Eu, entretanto, vinha tão moço como fora, não no rosto e nos cabelos, que começavam a embranquecer, mas na alma e no coração que estavam em flor. Foi essa a vantagem que tirei das minhas constantes viagens. Não há decepções possíveis para um viajante, que apenas vê de passagem o lado belo da natureza humana e não ganha tempo de conhecer-lhe o lado feio. Mas deixemos estas filosofias inúteis.
Também
achei mudado o nosso Rio de Janeiro, e mudado para melhor. O jardim do Rocio, o boulevard Carceller, cinco
ou seis hotéis novos, novos prédios, grande movimento comercial e popular, tudo
isso fez em meu espírito uma agradável impressão.
Fui
hospedar-me no Hotel Damiani. Chamo-lhe assim para conservar um nome que tem
para mim recordações saudosas. Agora o hotel chama-se Ravot. Tem defronte uma
grande casa de modas e um escritório de jornal político. Dizem-me que a casa de
modas faz mais negócio que o jornal. Não admira; poucos lêem, mas todos se
vestem.
Estava eu
justamente a contemplar o espetáculo novo que a rua me oferecia quando vi
passar um indivíduo cuja fisionomia me não era estranha. Desci logo à rua e
cheguei à porta quando ele passava defronte.
—
Coutinho! exclamei.
— Macedo!
disse o interpelado correndo a mim.
Entramos
no corredor e aí demos aberta às nossas primeiras expansões.
— Que
milagre é este? por que estás aqui? quando chegaste?
Estas e
outras perguntas fazia-me o meu amigo entre repetidos abraços. Convidei-o a
subir e a almoçar comigo, o que aceitou, com a condição porém de que iria
buscar mais dois amigos nossos, que eu estimaria ver. Eram efetivamente dois excelentes companheiros de
outro tempo. Um deles estava à frente de uma grande casa comercial; o outro,
depois de algumas vicissitudes, fizera-se escrivão de uma vara cível.
Reunidos
os quatro na minha sala do hotel, foi servido um suculento almoço, em que aliás eu e o Coutinho tomamos parte. Os
outros limitavam-se a fazer a razão de alguns brindes e a propor outros.
Quiseram
que eu lhes contasse as minhas viagens; cedi francamente a este desejo natural.
Não lhes ocultei nada. Contei-lhes o que havia visto desde o Tejo
até o Danúbio, desde Paris até Jerusalém.
Fi-los assistir na imaginação às corridas
de Chantilly e às jornadas das caravanas no deserto; falei do céu nevoento de
Londres e do céu azul da Itália. Nada me escapou; tudo lhes referi.
até o Danúbio, desde Paris até Jerusalém.
Fi-los assistir na imaginação às corridas
de Chantilly e às jornadas das caravanas no deserto; falei do céu nevoento de
Londres e do céu azul da Itália. Nada me escapou; tudo lhes referi.
Cada qual
fez as suas confissões. O negociante não hesitou em dizer tudo quanto sofrera
antes de alcançar a posição atual. Deu-me notícia de que estava casado, e tinha
uma filha de dez anos no colégio. O escrivão achou-se um tanto envergonhado
quando lhe tocou a vez de dizer a sua vida; todos nós tivemos a delicadeza de
não insistir nesse ponto.
Coutinho
não hesitou em dizer que era mais ou menos o que era outrora a respeito da
ociosidade; sentia-se entretanto mudado e entrevia ao longe idéias
de
casamento.
— Não te
casaste? perguntei eu.
— Com a
prima Amélia? disse ele; não.
— Por quê?
— Porque
não foi possível.
— Mas
continuaste a vida solta que levavas?
— Que
pergunta! exclamou o negociante. É a mesma coisa que era há quinze anos. Não
mudou nada.
— Não
digas isso; mudei.
— Para
pior? perguntei eu rindo.
— Não,
disse Coutinho, não sou pior do que era; mudei nos sentimentos; acho que hoje
não me vale a pena cuidar de ser mais feliz do que sou.
— E podias
sê-lo, se te houvesse casado com tua prima. Amava-te muito aquela moça; ainda
me lembro das lágrimas que lhes vi derramar em um dia de
entrudo.
Lembras-te?
— Não me
lembra, disse Coutinho ficando mais sério do que estava; mais creio que deve
ter sido isso.
— E o que
é feito dela?
— Casou.
— Ah!
— É hoje
fazendeira; e dá-se perfeitamente com o marido. Mas não falemos nisto,
acrescentou Coutinho, enchendo um cálix de cognac; o que lá vai, lá vai!
Houve
alguns instantes de silêncio, que eu não quis interromper, por me parecer que o
nome da moça trouxera ao rapaz alguma recordação dolorosa.
Rapaz é
uma maneira de dizer. Coutinho contava já seus trinta e nove anos e tinha
alguns fios brancos na cabeça e na barba. Mas apesar desse evidente sinal do
tempo, eu aprazia-me em ver os meus amigos pelo prisma da recordação que levara
deles.
Coutinho
foi o primeiro que rompeu o silêncio.

— Pois que
estamos aqui reunidos, disse ele, ao cabo de quinze anos, deixem que, sem
exemplo, e para completar as nossas confidências recíprocas, eu lhes confesse
uma coisa, que nunca saiu de mim.
— Bravo!
disse eu; ouçamos a confidência de Coutinho.
Acendemos
nossos charutos. Coutinho começou a falar:
— Eu
namorava a prima Amélia, como sabem; o nosso casamento devia efetuar-se um ano
depois que daqui saíste. Não se efetuou por circunstâncias que ocorreram
depois, e com grande mágoa minha, pois gostava dela. Antes e depois amei e fui
amado muitas vezes; mas nem depois nem antes, e por nenhuma mulher fui amado
jamais como fui...
— Por tua
prima? perguntei eu.
— Não; por
uma cria de casa.
Olhamos
todos espantados um para outro. Ignorávamos esta circunstância, e estávamos a
cem léguas de semelhante conclusão. Coutinho não parece atender ao nosso espanto;
sacudia distraidamente a cinza do charuto e parecia absorto na recordação que o seu espírito evocava.
—
Chamava-se Mariana, continuou ele alguns minutos depois, e era uma gentil mulatinha nascida e criada como filha da casa,
e recebendo de minha mãe os mesmos afagos que ela dispensava às outras filhas.
Não se sentava à mesa, nem vinha à sala em ocasião de visitas, eis a diferença;
no mais era como se fosse pessoa livre, e até minhas irmãs tinham certa afeição
fraternal. Mariana possuía a inteligência
da sua situação, e não abusava dos cuidados com que era tratada. Compreendia
bem que na situação em que se achava só lhe restava pagar com muito
reconhecimento a bondade de sua senhora.
A sua
educação não fora tão completa como a de minhas irmãs; contudo, Mariana sabia
mais do que outras mulheres em igual caso. Além dos trabalhos de agulha que lhe
foram ensinados com extremo zelo, aprendera a ler e a escrever. Quando chegou
aos 15 anos teve desejo de saber francês, e minha irmã mais moça lho ensinou com
tanta paciência e felicidade, que Mariana em pouco tempo ficou sabendo tanto
como ela.
Como tinha
inteligência natural, todas estas coisas lhe foram fáceis. O desenvolvimento do
seu espírito não prejudicava o desenvolvimento de seus encantos. Mariana aos 18
anos era o tipo mais completo da sua raça. Sentia-se- lhe o fogo através da tez
morena do rosto, fogo inquieto e vivaz que lhe rompia dos olhos negros e
rasgados. Tinha os cabelos naturalmente encaracolados e curtos. Talhe esbelto e
elegante, colo voluptuoso, pé pequeno e mãos de senhora. É impossível que eu
esteja a idealizar esta criatura que no entanto me desapareceu dos olhos; mas
não estarei muito longe da verdade.
Mariana
era apreciada por todos quantos iam a nossa casa, homens e senhoras. Meu tio,
João Luís, dizia-me muitas vezes: — “Por que diabo está tua mãe guardando aqui
em casa esta flor peregrina? A rapariga precisa de tomar ar”.
Posso
dizer, agora que já passou muito tempo, esta preocupação do tio nunca me passou
pela cabeça; acostumado a ver Mariana bem tratada parecia-me ver nela uma
pessoa da família, e além disso, ser-me-ia doloroso contribuir para causar tristeza
a minha mãe.
Amélia ia
lá a casa algumas vezes; mas era o princípio, e antes que nenhum namoro houvesse entre nós. Cuido, porém, que
foi Mariana quem chamou a atenção da moça para mim. Amélia deu-mo a entender um
dia. O certo é que
uma tarde, depois de jantar, estávamos a tomar
café no terraço, e eu reparei na beleza de Amélia com uma atenção mais demorada
que de costume. Fosse acaso ou fenômeno magnético, a moça olhava também para
mim. Prolongaram-se os nossos olhares... ficamos a amar um ao outro. Todos os
amores começam pouco mais ou menos assim.
uma tarde, depois de jantar, estávamos a tomar
café no terraço, e eu reparei na beleza de Amélia com uma atenção mais demorada
que de costume. Fosse acaso ou fenômeno magnético, a moça olhava também para
mim. Prolongaram-se os nossos olhares... ficamos a amar um ao outro. Todos os
amores começam pouco mais ou menos assim.
Acho
inútil contar minuciosamente este namoro de rapaz, que vocês em parte conhecem,
e que não apresentou episódio notável. Meus pais aprovaram a minha escolha; os
pais de Amélia fizeram o mesmo. Nada se opunha à nossa felicidade. Preparei-me
um dia de ponto em branco e fui pedir a meu tio a mão da filha. Foi-me ela
concedida, com a condição apenas de que o casamento seria efetuado alguns meses
depois, quando o irmão de Amélia tivesse completado os estudos, e pudesse
assistir à cerimônia com a sua carta de bacharel.
Durante
este tempo Mariana estava em casa de uma parenta nossa que nô-la foi pedir para costurar uns vestidos. Mariana era
excelente costureira. Quando ela voltou para casa, estava assentado o meu
casamento com Amélia; e, como era natural, eu passava a maior parte do tempo em
casa da prima, saboreando aquelas
castas efusões de amor e ternura que antecedem o casamento. Mariana notou as
minhas prolongadas ausências, e, com uma dissimulação assaz inteligente,
indagou de minha irmã Josefa a causa delas. Disse-lho Josefa. Que se passou
então no espírito de Mariana? Não sei; mas no dia seguinte, depois do almoço
quando eu me dispunha a ir vestir-me, Mariana veio encontrar-me no corredor que
ia ter ao meu quarto, com o pretexto de entregar-me um maço de charuto que me
caíra do bolso. O maço fora previamente tirado da caixa que eu tinha no quarto.
— Aqui
tem, disse ela com voz trêmula.
— O que é?
perguntei.
— Estes
charutos... caíram do bolso de senhor moço.
— Ah!
Recebi o
maço de charutos e guardei-o no bolso do casaco; mas durante esse tempo,
Mariana conservou-se diante de mim. Olhei para ela; tinha os olhos postos no
chão.
— Então,
que fazes tu? disse eu em tom de galhofa.
— Nada,
respondeu ela levantando os olhos para mim. Estavam rasos de lágrimas.
Admirou-me essa manifestação inesperada da parte de uma rapariga que todos estavam
acostumados a ver alegre e descuidosa da vida. Supus que houvesse cometido
alguma falta e recorresse a mim para protegê-la junto de minha mãe. Nesse caso
a falta devia ser grande, porque minha mãe era a bondade em pessoa, e tudo
perdoava às suas amadas crias.
— Que
tens, Mariana? perguntei.
E como ela
não respondesse e continuasse a olhar para mim, chamei em voz alta por minha mãe. Mariana apressou-se a tapar-me
a boca, e esquivando-se às minhas mãos
fugiu pelo corredor fora.
Fiquei a
olhar ainda alguns instantes para ela, sem compreender nem as lágrimas, nem o gesto, nem a fuga. O meu
principal cuidado era outro; a lembrança do incidente passou depressa, fui
vestir-me e saí.

Quando
voltei à casa não vi Mariana, nem reparei na falta dela. Acontecia isso muitas
vezes. Mas depois de jantar lembrou-me o incidente da véspera e perguntei
a Josefa o que haveria magoado a rapariga que tão romanescamente me falara
no corredor.
— Não sei,
disse Josefa, mas alguma coisa haverá porque Mariana anda triste
desde
anteontem. Que supões tu?
— Alguma
coisa faria e tem medo da mamãe.
— Não,
disse Josefa; pode ser antes algum namoro.
— Ah! tu
pensas quê?
— Pode
ser.
— E quem
será o namorado da senhora Mariana, perguntei rindo. O copeiro ou o cocheiro?
— Tanto
não sei eu; mas seja quem for, será alguém que lhe inspirasse amor; é quanto
basta para que se mereçam um ao outro.
—
Filosofia humanitária!
—
Filosofia de mulher, respondeu Josefa com um ar tão sério que me impôs silêncio.
Mariana
não me apareceu nos três dias seguintes. No quarto dia, estávamos almoçando,
quando ela atravessou a sala de jantar, tomou a bênção a todos e foi para
dentro. O meu quarto ficava além da sala de jantar e tinha uma janela que dava para
o pátio e enfrentava com a janela do gabinete de costura. Quando fui para o meu
quarto, Mariana estava nesse gabinete ocupada em preparar vários objetos
para uns trabalhos de agulha. Não tinha os olhos em mim, mas eu percebia
que o seu olhar acompanhava os meus movimentos. Aproximei-me da janela e
disse-lhe:
— Estás
mais alegre, Mariana?
A
mulatinha assustou-se, voltou a cara para diversos lados, como se tivesse
medo de
que as minhas palavras fossem ouvidas, e finalmente impôs-me silêncio
com o dedo
na boca.
— Mas que
é? perguntei eu dando à minha voz a moderação compatível com a
distância.
Sua única
resposta foi repetir-me o mesmo gesto.
Era
evidente que a tristeza de Mariana tinha uma causa misteriosa, pois que ela receava
revelar nada a esse respeito.
Que seria
senão algum namoro como minha irmã supunha? Convencido disto, e querendo
continuar uma investigação curiosa, aproveitei a primeira ocasião que se me
ofereceu.
— Que tens
tu, Mariana? disse eu; andas triste e misteriosa. É algum namorico? Anda,
fala; tu és estimada por todos cá de casa. Se gostas de alguém poderás ser feliz
com ele porque ninguém te oporá obstáculos aos teus desejos.
— Ninguém?
perguntou ela com singular expressão de incredulidade.

— Quem
teria interesse nisso?
— Não
falemos nisso, nhonhô. Não se trata de amores, que eu não posso ter amores. Sou uma simples escrava.
— Escrava,
é verdade, mas escrava quase senhora. És tratada aqui como filha da casa.
Esqueces esses benefícios?
— Não os
esqueço; mas tenho grande pena em havê-los recebido.
— Que
dizes, insolente?
—
Insolente? disse Mariana com altivez. Perdão! continuou ela voltando à sua humildade
natural e ajoelhando-se a meus pés; perdão, se disse aquilo; não foi por
querer: eu sei o que sou; mas se nhonhô soubesse a razão estou certa que me
perdoaria.
Comoveu-me
esta linguagem da rapariga. Não sou mau; compreendi que alguma grande preocupação teria feito com que Mariana
esquecesse por instantes a sua condição e o respeito que nos devia a todos.
— Está
bom, disse eu, levanta-te e vai-te embora; mas não tornes a dizer coisas dessas
que me obrigas a contar tudo à senhora velha.
Mariana
levantou-se, agarrou-me na mão, beijou-a repetidas vezes entre lágrimas e
desapareceu.
Todos
estes acontecimentos tinham chamado a minha atenção para a mulatinha. Parecia-me
evidente que ela sentia alguma coisa por alguém, e ao mesmo tempo que o sentia,
certa elevação e nobreza. Tais sentimentos contrastavam com a fatalidade da sua
condição social. Que seria uma paixão daquela pobre escrava educada com mimos de
senhora? Refleti longamente nisto tudo, e concebi um projeto romântico: obter a
confissão franca de Mariana e, no caso em que se tratasse de um amor que a
pudesse tornar feliz, pedir a minha mãe a liberdade da escrava.
Josefa
aprovou a minha idéia, e incumbiu-se de interrogar a rapariga e alcançar pela
confiança aquilo que me seria mais difícil obter pela imposição ou sequer pelo
conselho.
Mariana
recusou dizer coisa nenhuma a minha irmã. Debalde empregou esta todos os meios de sedução possíveis entre uma
senhora e uma escrava. Mariana respondia invariavelmente que nada havia que
confessar. Josefa comunicou-me o que se passara entre ambas.
—Tentarei
eu, respondi; verei se sou mais feliz.
Mariana
resistiu às minhas interrogações repetidas, asseverando que nada sentia e rindo
de que se pudesse supor semelhante coisa. Mas era um riso forçado, que antes confirmava a suspeita do que a negativa.
— Bem,
disse eu, quando me convenci de que nada podia alcançar; bem, tu negas o
que te pergunto. Minha mãe saberá interrogar-te.
Mariana
estremeceu.
— Mas,
disse ela, por que razão sinhá velha há de saber disto? Eu já disse a verdade.
— Não
disseste, respondi eu; e não sei por que recusas dizê-la quando tratamos
todos da tua felicidade.
todos da tua felicidade.
— Bem,
disse Mariana com resolução, promete que se eu disser a verdade não me
interrogará mais?
— Prometo,
disse eu rindo.
— Pois
bem; é verdade que eu gosto de uma pessoa...
— Quem é?
— Não
posso dizer.
— Por quê?
— Porque é
um amor impossível.
—
Impossível? Sabes o que são amores impossíveis?
Roçou
pelos lábios da mulatinha um sorriso de amargura e dor.
— Sei!
disse ela.
Nem
pedidos, nem ameaças conseguiram de Mariana uma declaração positiva a este respeito. Josefa foi mais feliz do que
eu; conseguiu não arrancar-lhe o segredo, mas suspeitar-lho, e veio dizer-me o
que lhe parecia.
— Que seja
eu o querido de Mariana? perguntei-lhe com um riso de mofa e incredulidade.
Estás louca, Josefa. Pois ela atrever-se-ia!...
— Parece
que se atreveu.
— A
descoberta é galante; e realmente não sei o que pense disto...
Não
continuei, disse a Josefa que não falasse em semelhante coisa e desistisse de maiores
explorações. Na minha opinião o caso tomava outro caráter; tratava-se de uma simples exaltação de sentidos.
Enganei-me.
Cerca de
cinco semanas antes do dia marcado para o casamento, Mariana adoeceu. O médico
deu à moléstia um nome bárbaro, mas na opinião de Josefa era doença de amor. A
doente recusou tomar nenhum remédio; minha mãe estava louca de pena; minhas irmãs sentiam deveras
a moléstia da escrava. Esta ficava cada
vez mais abatida; não comia, nem se medicava; era de recear que morresse. Foi
nestas circunstâncias que eu resolvi fazer um ato de caridade. Fui ter em
Mariana e pedi-lhe que vivesse.
— Manda-me
viver? perguntou ela.
— Sim.
Foi eficaz
a lembrança; Mariana restabeleceu-se em pouco tempo. Quinze dias depois estava completamente de pé.
Que
esperanças concebera ela com as minhas palavras, não sei; cuido que elas só
tiveram efeito por lhe acharem o espírito abatido. Acaso contaria ela que eu desistisse
do casamento projetado e do amor que tinha à prima, para satisfazer os seus
amores impossíveis? Não sei; o certo é que não só se lhe restaurou a saúde como
também lhe voltou a alegria primitiva
Confesso, entretanto que, apesar de não
competir de modo nenhum os sentimentos de Mariana, entrei a olhar para ela com
outros olhos. A rapariga tornara-se interessante para mim, e qualquer que seja
a condição de uma mulher, há sempre dentro de nós um fundo de vaidade que se
lisonjeia com a afeição que ela nos vote. Além disto, surgiu em meu espírito
uma idéia que a razão pode condenar, mas que nossos costumes aceitam
perfeitamente. Mariana encarregara-se de provar que estava acima das
veleidades. Um dia de manhã fui acordado
pelo alvoroço que havia em casa. Vesti-me à pressa e fui saber o que era.
Mariana tinha desaparecido de casa. Achei minha mãe desconsoladíssima: estava
triste e indignada ao mesmo tempo. Doía-lhe a ingratidão da escrava. Josefa veio ter comigo.
Confesso, entretanto que, apesar de não
competir de modo nenhum os sentimentos de Mariana, entrei a olhar para ela com
outros olhos. A rapariga tornara-se interessante para mim, e qualquer que seja
a condição de uma mulher, há sempre dentro de nós um fundo de vaidade que se
lisonjeia com a afeição que ela nos vote. Além disto, surgiu em meu espírito
uma idéia que a razão pode condenar, mas que nossos costumes aceitam
perfeitamente. Mariana encarregara-se de provar que estava acima das
veleidades. Um dia de manhã fui acordado
pelo alvoroço que havia em casa. Vesti-me à pressa e fui saber o que era.
Mariana tinha desaparecido de casa. Achei minha mãe desconsoladíssima: estava
triste e indignada ao mesmo tempo. Doía-lhe a ingratidão da escrava. Josefa veio ter comigo.
— Eu suspeitava,
disse ela, que alguma coisa acontecesse. Mariana andava alegre demais;
parecia-me contentamento fingido para encobrir algum plano. O plano foi este.
Que te parece?
— Creio
que devemos fazer esforços para capturá-la, e uma vez restituída à casa, colocá-la na situação verdadeira do cativeiro.
Disse isto
por me estar a doer o desespero de minha mãe. A verdade é que, por simples egoísmo, eu desculpava o ato da
rapariga.
Parecia-me
natural, e agradava-me ao espírito, que a rapariga tivesse fugido para não
assistir à minha ventura, que seria realidade daí a oito dias. Mas a idéia de
suicídio veio aguar-me o gosto; estremeci com a suspeita de ser involuntariamente
causa de um crime dessa ordem; impelido pelo remorso, saí apressadamente em busca de Mariana.
Achei-me
na rua sem saber o que devia fazer. Andei cerca de vinte minutos inutilmente,
até que me ocorreu a idéia natural de recorrer à polícia; era prosaica a
intervenção da polícia, mas eu não fazia romance; ia simplesmente em cata de uma
fugitiva.
A polícia
nada sabia de Mariana; mas lá deixei a nota competente; correram agentes em
todas as direções: fui eu mesmo saber nos arrabaldes se havia notícia de
Mariana. Tudo foi inútil; às três horas da tarde voltei para casa sem poder
tranqüilizar minha família. Na minha opinião tudo estava perdido.
Fui à
noite à casa de Amélia, aonde não fora de tarde, motivo pelo qual havia recebido
um recado em carta a uma de minhas irmãs. A casa de minha prima ficava em
uma esquina. Eram oito horas da noite quando cheguei à porta da casa. A
três ou quatro passos estava um vulto de mulher cosido com a parede. Aproximei-me:
era Mariana.
— Que
fazes aqui? perguntei eu.
— Perdão,
nhonhô; vinha vê-lo.
— Ver-me?
mas por que saíste de casa, onde eras tão bem tratada, e donde não tinhas o
direito de sair, porque és cativa?
— Nhonhô,
eu saí porque sofria muito...
— Sofrias
muito! Tratavam-te mal? Bem sei o que é; são os resultados da educação
que minha mãe te deu. Já te supões senhora e livre. Pois enganas-te; hás de
voltar já, e já, para casa. Sofrerás as conseqüências da tua ingratidão. Vamos...
— Não!
disse ela; não irei.
— Mariana,
tu abusas da afeição que todos temos por ti. Eu não tolero essa recusa, e se me
repetes isso...
— Que
fará?
— Irás à
força - irás com dois soldados.
— Nhonhô
fará isso? disse ela com voz trêmula. Não quero obrigá-lo a incomodar os
soldados, iremos juntos, ou irei só. O que eu queria, é que nhonhô não fosse tão
cruel... porque enfim eu não tenho culpa se... Paciência! vamos... eu vou.
Mariana
começou a chorar. Tive pena dela.
—
Tranqüiliza-te, Mariana, disse-lhe; eu intercederei por ti. Mamãe não te fará mal.
— Que
importa que faça? Eu estou disposta a tudo... Ninguém tem que ver com as minhas
desgraças... Estou pronta; podemos ir.
— Saibamos
outra coisa, disse eu, alguém te seduziu para fugir?
Esta
pergunta era astuciosa; eu desejava apenas desviar do espírito da rapariga qualquer
suspeita de que eu soubesse dos seus amores por mim. Foi desastrada a astúcia.
O único efeito da pergunta foi indigná-la.
— Se
alguém me seduziu? perguntou ela; não, ninguém; fugi porque eu o amo, e não
posso ser amada, eu sou uma infeliz escrava. Aqui está por que eu fugi. Podemos
ir; já disse tudo. Estou pronta a carregar com as conseqüências disto.
Não pude
arrancar mais nada à rapariga. Apenas quando lhe perguntei se havia comido,
respondeu-me que não, mas que não tinha fome.
Chegamos à
casa eu e ela perto das nove horas da noite. Minha mãe já não tinha esperanças
de tornar a ver Mariana; o prazer que a vista da escrava lhe deu foi maior que
a indignação pelo seu procedimento. Começou por invectivá-la. Intercedi a tempo
de acalmar a justa indignação de minha mãe e Mariana foi dormir tranqüilamente.
Não sei se
tranqüilamente. No dia seguinte tinha os olhos inchados e estava triste. A
situação da pobre rapariga interessara-me bastante, o que era natural, sendo eu
a causa indireta daquela dor profunda. Falei muito nesse episódio em casa de
minha prima. O tio João Luís disse-me em particular que eu fora um asno e um ingrato.
— Por quê?
perguntei-lhe.
— Porque
devias ter posto Mariana debaixo da minha proteção, a fim de livrá-la do mau
tratamento que vai ter.
— Ah! não,
minha mãe já lhe perdoou.
— Nunca
lhe perdoará como eu.
Falei
tanto em Mariana que minha prima entrou a sentir um disparatado ciúme. Protestei-lhe
que era loucura e abatimento ter zelos de uma cria de casa, e que o meu
interesse era simples sentimento de piedade. Parece que as minhas palavras não
lhe fizeram grande impressão.
Extremamente
leviana, Amélia não soube conservar a necessária dignidade,
quando foi a minha casa. Conversou muito na
necessidade de tratar severamente as escravas, e achou que era dar mau exemplo
mandar-lhes ensinar alguma coisa.
quando foi a minha casa. Conversou muito na
necessidade de tratar severamente as escravas, e achou que era dar mau exemplo
mandar-lhes ensinar alguma coisa.
Minha mãe
admirou-se muito desta linguagem na boca de Amélia e redarguiu com aspereza o
que lhe dava direito a sua vontade. Amélia insistiu; minhas irmãs combateram as suas opiniões: Amélia ficou
amuada. Não havia pior posição para uma senhora.
Nada
escapara a Mariana desta conversa entre Amélia e minha família; mas ela era
dissimulada e nada disse que pudesse trair os seus sentimentos. Pelo contrário redobrou de esforços para agradar a
minha prima; desfez-se em agrados e respeitos. Amélia recebia todas essas
demonstrações com visível sobranceria em vez de as receber com fria dignidade.
Na
primeira ocasião em que pude falar a minha prima, chamei a sua atenção para
esta situação absurda e ridícula. Disse-lhe que, sem o querer, estava a humilhar-se
diante de uma escrava. Amélia não compreendeu o sentimento que me ditou estas
palavras, nem a procedência das minhas palavras. Viu naquilo uma defesa de
Mariana; respondeu-me com algumas palavras duras e retirou-se para os aposentos de minhas irmãs onde chorou
à vontade. Finalmente tudo se acalmou e
Amélia voltou tranqüila para casa.
Quatro
dias antes do dia marcado para o meu casamento, era a festa do natal. Minha mãe costumava dar festas às escravas.
Era um costume que lhe deixara minha avó. As festas consistiam em dinheiro ou
algum objeto de pouco valor. Mariana recebia ambas as coisas por uma especial
graça. De tarde tiveram gente em casa para jantar: alguns amigos e parentes.
Amélia estava presente. Meu tio João Luís era grande amador de discursos à
sobremesa. Mal começavam a entrar os doces, quando ele se levantou e começou um
discurso que a julgar pelo intróito,
devia ser extenso. Como ele tinha suma graça, eram gerais as risadas desde que
empunhou o copo. Foi no meio dessa geral alegria que uma das escravas veio dar
parte de que Mariana havia desaparecido.
Este
segundo ato de rebeldia da mulatinha produziu a mais furiosa impressão em todos.
Da primeira vez houve alguma mágoa e saudade de mistura com a indignação. Desta
vez houve indignação apenas. Que sentimento devia inspirar a todos a
insistência dessa rapariga em fugir de uma casa onde era tratada como filha? Ninguém duvidou mais que Mariana era
seduzida por alguém, idéia que na primeira vez se desvaneceu mediante uma
piedosa mentira da minha parte; como duvidar agora?
Tais não
eram as minhas impressões. Senhor do funesto segredo da escrava, sentia-me
penalizado por ser causa indireta das loucuras dela e das tristezas de minha
mãe. Ficou assentado que se procuraria a fugitiva e se lhe daria o castigo competente.
Deixei que esse momento de cólera se consumasse, e levantei-me para ir procurar
Mariana.
Amélia
ficou desgostosa com esta resolução, e bem o revelou no olhar; mas eu fingi que
a não percebia e saí.
Dei os
primeiros passos necessários e usuais. A polícia nada sabia, mas ficou avisada
e empregou meios para alcançar a fugitiva. Eu suspeitava que desta vez ela
tivesse cometido suicídio; fiz neste sentido as diligências necessárias para
ter alguma notícia dela viva ou morta.
Tudo foi
inútil.
Quando
voltei à casa eram dez horas da noite; todos estavam à minha espera, menos o tio e a prima que já se haviam
retirado.

Minha irmã
contou-me que Amélia saíra furiosa, porque achava que eu estava dando maior atenção do que devia a uma
escrava, embora bonita, acrescentou ela.
Confesso
que naquele momento o que me preocupava mais era Mariana; não porque eu correspondesse aos seus sentimentos
por mim, mas porque eu sentia sérios remorsos de ser causa de um crime. Fui
sempre pouco amante de aventuras e lances arriscados e não podia pensar sem
algum terror na possibilidade de morrer alguém por mim.
Minha
vaidade não era tamanha que me abafasse os sentimentos de piedade cristã. Neste
estado as invectivas da minha noiva não me fizeram grande impressão, e não foi por causa delas que eu
passei a noite em claro.
Continuei
no dia seguinte as minhas pesquisas, mas nem eu nem a polícia fomos felizes.
Tendo
andado muito, já a pé, já de tílburi, achei-me às cinco horas da tarde no Largo
de S. Francisco de Paula, com alguma vontade de comer; a casa ficava um pouco longe e eu queria continuar depois as
minhas averiguações. Fui jantar a um hotel que então havia na antiga Rua dos
Latoeiros.
Comecei a
comer distraído e ruminando mil idéias contrárias, mil suposições absurdas.
Estava no meio do jantar quando vi descer do segundo andar da casa um criado
com uma bandeja onde havia vários pratos cobertos.
— Não quer
jantar, disse o criado ao dono do hotel que se achava no balcão.
— Não
quer? perguntou este; mas então... não sei o que faça... reparaste se...
Eu acho
bom ir chamar a polícia.
Levantei-me
da mesa e aproximei-me do balcão.
— De que
se trata? perguntei eu.
— De uma
moça que aqui apareceu ontem, e que ainda não comeu até hoje...
Pedi-lhe
os sinais da pessoa misteriosa. Não havia dúvida. Era Mariana.
— Creio
que sei quem é, disse eu, e ando justamente em procura dela. Deixe-me subir.
O homem
hesitou; mas a consideração de que não lhe podia convir continuar a ter em
casa uma pessoa por cuja causa viesse a ter questões com a polícia, fez com que me
deixasse o caminho livre.
Acompanhou-me
o criado, a quem incumbi de chamar por ela, porque se conhecesse
a minha voz, supunha eu que me não quisesse abrir.
Assim se
fez. Mariana abriu a porta e eu apareci. Deu um grito estridente e lançou-se-me
nos braços. Repeli aquela demonstração com toda a brandura que a situação
exigia.
— Não
venho aqui para receber-te abraços, disse eu; venho pela segunda vez buscar-te
para casa, donde pela segunda vez fugiste.
A palavra fugiste escapou-me dos lábios; todavia, não
lhe dei importância senão quando vi
a impressão que ela produziu em Mariana. Confesso que devera ter alguma
caridade mais; mas eu queria conciliar os meus sentimentos com os

meus
deveres, e não fazer com que a mulher não se esquecesse de que era escrava.
Mariana parecia disposta a sofrer tudo dos outros, contanto que obtivesse a
minha compaixão. Compaixão tinha-lhe eu; mas não lho manifestava, e era esse
todo o mal.
Quando a
fugitiva recobrou a fala, depois das emoções diversas por que passara desde que
me viu chegar, declarou positivamente que era sua intenção não sair dali.
Insisti com ela dizendo-lhe que poderia ganhar tudo procedendo bem, ao passo
que tudo perderia continuando naquela situação.
— Pouco
importa, disse ela; estou disposta a tudo.
— A
matar-te, talvez? perguntei eu.
— Talvez,
disse ela sorrindo melancolicamente; confesso-lhe até que a minha intenção era
morrer na hora do seu casamento, a fim de que fossemos ambos felizes, — nhonhô
casando-se, eu morrendo.
— Mas
desgraçada, tu não vês que...
— Eu bem
sei o que vejo, disse ela; descanse; era essa a minha intenção, mas pode ser
que o não faça...
Compreendi
que era melhor levá-la pelos meios brandos; entrei a empregá-los sem esquecer
nunca a reserva que me impunha a minha posição. Mariana estava resolvida a não
voltar. Depois de gastar cerca de uma hora, sem nada obter, declarei-lhe
positivamente que ia recorrer aos meios violentos, e que já lhe não era
possível resistir. Perguntou-me que meios eram; disse-lhe que eram os agentes
policiais.
— Bem vês,
Mariana, acrescentei, sempre hás de ir para casa; é melhor que me não obrigues
a um ato que me causaria alguma dor.
— Sim?
perguntou ela com ânsia; teria dor em levar-me assim para casa?
— Alguma
pena teria decerto, respondi; porque tu foste sempre boa rapariga; mas que
farei eu se continuas a insistir em ficar aqui?
Mariana
encostou a cabeça à parede e começou a soluçar; procurei acalmá-la; foi impossível.
Não havia remédio; era necessário empregar o meio heróico. Saí ao corredor para
chamar pelo criado que tinha descido logo depois que a porta se abriu.
Quando
voltei ao quarto, Mariana acabava de fazer um movimento suspeito. Parecia-me
que guardava alguma coisa no bolso. Seria alguma arma?
— Que
escondeste aí? perguntei eu.
— Nada,
disse ela.
— Mariana,
tu tens alguma idéia terrível no espírito... Isso é alguma arma...
— Não,
respondeu ela.
Chegou o
criado e o dono da casa. Expus-lhes em voz baixa o que queria; o criado saiu, o
dono da casa ficou.
— Eu
suspeito que ela tem alguma arma no bolso para matar-se; cumpre arrancar-lha.
Dizendo
isto ao dono da casa, aproximei-me de Mariana.
— Dá-me o
que tens aí.
Ela
contraiu um pouco o rosto. Depois, metendo a mão no bolso, entregou-me o objeto que lá havia guardado.
Era um
vidro vazio.
— Que é
isto, Mariana? perguntei eu, assustado.
— Nada,
disse ela; eu queria matar-me depois d’amanhã. Nhonhô apressou a minha morte,
nada mais.
— Mariana!
exclamei eu aterrado.
— Oh!
continuou ela com voz fraca; não lhe quero mal por isso. Nhonhô não tem culpa:
a culpa é da natureza. Só o que eu lhe peço é que não me tenha raiva, e que se
lembre algumas vezes de mim...
Mariana
caiu sobre a cama. Pouco depois entrava o inspetor. Chamou-se à pressa um
médico; mas era tarde. O veneno era violento; Mariana morreu às 8 horas da noite.
Sofri
muito com este acontecimento; mas alcancei que minha mãe perdoasse à infeliz,
confessando-lhe a causa da morte dela. Amélia nada soube, mas nem por isso
deixou o fato de influir em seu espírito. O interesse com que eu procurei a rapariga,
e a dor que a sua morte me causou, transtornaram a tal ponto os sentimentos da
minha noiva, que ela rompeu o casamento dizendo ao pai que havia mudado de
resolução.
Tal foi,
meus amigos, este incidente da minha vida. Creio que posso dizer ainda hoje que
todas as mulheres de quem tenho sido amado, nenhuma me amou mais do que aquela.
Sem alimentar-se de nenhuma esperança, entregou-se alegremente ao fogo do martírio; amor obscuro,
silencioso, desesperado, inspirando o
riso ou a indignação, mas no fundo, amor imenso e profundo, sincero e
inalterável.
Coutinho
concluiu assim a sua narração, que foi ouvida com tristeza por todos nós. Mas
daí a pouco saíamos pela Rua do Ouvidor fora, examinando os pés das damas que
desciam dos carros, e fazendo a esse respeito mil reflexões mais ou menos
engraçadas e oportunas. Duas horas de conversa tinha-nos restituído a mocidade.
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Nota:
Texto-fonte: Obra Completa, Machado de Assis, vol. II, Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.. Disponível digitalmente no site: Domínio Público
Texto-fonte: Obra Completa, Machado de Assis, vol. II, Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.. Disponível digitalmente no site: Domínio Público
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