A COSTURA
Tão
bonita, tão bem feita, dona de tão lindos olhos e de formoso sorriso, a Maroca,
— mas tão tola!... Aos dezessete anos, tinha a ingenuidade das crianças de mama;
e o seu coração só entendia o amor dos gatos, das bonecas, de quantos brinquedos
inocentes podem interessar a alma de uma criança. A mãe, lavadeira e engomadeira
de fama, dizia sempre ao seu compadre e vizinho Manoel Tesoura, — alfaiate de
bairros:
— Olhe,
compadre! Esta é que não me dá trabalho nenhum: a pobre pequena nem sabe o que
é namorar! Quando a deixo em casa com o irmão pequeno, saio com a alma tão
tranqüila como se a deixasse guardada por todo um batalhão... Virtude e
inocência até ali, compadre!
E o
Manoel Tesoura, piscando o olho, respondia:
— Assim
é que elas se querem, comadre, assim é que elas se querem... Isto de raparigas,
— quanto mais sabidas, mais difíceis de guardar...
De fato,
quando a velha ia ao rio lavar a sua roupa, a Maroca ficava sozinha, brincando
com o irmão, o Antonico, que só tinha seis anos. E tão inocente era ela como
ele. E, às vezes, o Manoel Tesoura vinha ali passar um bocado de tempo a conversar
com a rapariga, e trazia a sua agulha, e as suas fazendas, e as suas
linhas,
e ficava a admirar aquela mocidade e aquela inocência. E foi um dia, a velha
lavadeira, ao voltar do rio com a roupa molhada, achou sozinho em casa o
pequeno, que dormia. Chamou:
—
Maroca! Maroca!
Nada...
Saiu, foi à casa do alfaiate, bateu à porta:
—
Compadre! compadre!
Nada...
Já preocupada, voltou a casa, acordou o Antonico:
— Que é
da mana, filho?
E o
pequeno, estremunhado:
— Mana
saiu, foi-se embora com seu Manoel... Seu Manoel coseu ela, coseu, coseu, e
depois disse a ela que era mais melhor ir-se embora juntos, por que mamãe não
havia de gostar de ver ela cosida...
—
Cosida? Como foi que seu Manoel podia coser a mana, filho?
— Coseu,
mamãe, coseu bem cosida, sim senhora. Coseu bem cosida com uma agulha muito
grossa... Até seu Manoel coseu ela com dois novelos de linha!
Até seu
Manoel me pediu que eu suspendesse os novelos dele, mamãe!...
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Nota bibliográfica:
Olavo
Bilac (com o pseudônimo de Bob): "Contos para Velhos", obra
digitalizada por: NEAD – Núcleo de Educação
à Distância, da Universidade da Amazônia.
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