AS PARADAS
O Norberto, que a princípio aceitou com entusiasmo as paradas dos
bondes de Botafogo, é hoje o maior inimigo delas. Querem saber por quê? Eu lhes
conto:
O pobre rapaz encontrou uma noite, na Exposição, a mulher mais
bela e mais fascinante que os seus olhos ainda viram, e essa mulher - oh,
felicidade!... oh, ventura!... -, essa mulher sorriu-lhe meigamente e com um
doce olhar convidou-o a acompanhá-la.
O Norberto não esperou repetição do convite: acompanhou-a.
Ela desceu a Avenida dos Pavilhões, encaminhou-se para o portão, e
saiu como quem ia tomar o bonde; ele seguiu-a, mas estava tanto povo a sair,
que a perdeu de vista.
Desesperado, correu para os bondes, que uns seis ou sete havia
prontos a partir, e subiu a todos os estribos, procurando em vão com os olhos
esbugalhados a formosa desconhecida.
- Provavelmente foi de carro, pensou o Norberto, que logo se pôs a
caminho de casa.
Deitou-se mas não pôde conciliar o sono: a imagem daquela mulher
não lhe saía da mente. Rompia a aurora quando conseguiu adormecer para sonhar
com ela, e no dia seguinte não se passou um minuto sem que pensasse naquele
feliz encontro.
Daí por diante foi um martírio. O desditoso namorado começou a
emagrecer, muito admirado de que lhe causassem tais efeitos um simples olhar e
um simples sorriso.
Passaram-se alguns dias e cada vez mais crescia aquele amor
singular, quando uma tarde - oh, que ventura!... oh, que felicidade!... -, uma
tarde passeando no Catete, o Norberto vê, num bonde das Laranjeiras, a dama da
Exposição. Ela não o viu.
O pobre-diabo fez sinal ao condutor para parar, mas por fatalidade
o poste da parada estava muito longe e
o bonde não
parou. E não
haver ali à
mão um tílburi,
uma caleça, um automóvel!...
O Norberto deitou
a correr atrás
do bonde, mas
só conseguiu esfalfar-se. Que
pernas humanas haverá tão rápidas como a eletricidade?
Esse novo encontro acendeu mais viva chama no peito do Norberto, e
não tiveram conta os passeios que ele deu do Largo do Machado às Águas Férreas,
na esperança de ver a sua amada e falar-lhe.
Oito dias depois, o Norberto percorria de bonde, pela centésima
vez, as Laranjeiras, quando, nas alturas do Instituto Pasteur, viu passar - oh,
felicidade!... oh, ventura!... -, viu passar na rua a mulher que tanto o
sobressaltava.
- Pare! pare!... gritou ele ao condutor.
- Aqui não posso; vamos ao poste de parada!
O Norberto quis descer, mas a rapidez com que o bonde rodava era
tamanha, que não se atreveu.
Chegando ao poste de parada, ele atirou-se à rua, e deitou a
correr para o lugar onde vira a mulher, mas, onde estava ela? Tinha desaparecido!.
Aí está por que o Norberto é hoje o maior inimigo das paradas.
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Nota:
Texto-fonte: Arthur de Azevedo: Contos Diversos. Data não identificada
Texto-fonte: Arthur de Azevedo: Contos Diversos. Data não identificada
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