CAMINHEIRO
Eu, peregrino
errante desta vida,
Na aridez de um
deserto miserando,
Venho, há trinta e
três anos caminhando
Sem pousada, sem
paz e sem guarida.
Solitário e
infeliz, de quando em quando
Vejo abrir-se em
meu ser nova ferida.
Paro, contemplo a
estrada percorrida
E, a soluçar,
prossigo cambaleando.
Não conheço um
minuto de alegria.
E, ante as trevas
da noite ou à luz do dia,
Nunca encontrei o
vulto de um carinho.
Assim, de mãos
vazias, vou penando,
Com o coração
descrente, e os pés sangrando
Nas arestas das
pedras do caminho.
POETA
Tu ficarás, embora
o mundo inteiro
Reverta ao caos, e
a própria humanidade
Regrida ao
barbarismo. És o primeiro
E, assim,
penetrarás na Eternidade.
Porque, sereno em
meio à tempestade,
Percorrerás altivo
o teu roteiro.
Se és arauto do
Sonho e da Verdade,
Não passarás. Tu
ficarás, pioneiro.
E morto, um dia,
além desta existência,
Sentirás com que
força e resistência
Teus sonhos,
extra-humanos e imortais,
No esquecimento e
na tristeza imersos,
Refulgirão na
opala dos teus versos
Como a luz na
pureza dos cristais!
TEUS OLHOS VERDES
Bandeirante do
amor, parti cantando
Na busca ingrata
de jazidas puras.
E depois de carpir
mil amarguras
Nos matagais da
vida, soluçando.
Tive sonhos
febris. Sofri tonturas
Ante o fulgor do
que vivi buscando.
Não conheci no
pobre peito, arfando,
As carícias, os
beijos, as ternuras.
E regressei,
supondo haver achado
As minas divinais
de um sonho ousado,
Entre rios,
florestas, entre abrolhos.
E nunca alguém
achou tanta riqueza
Como eu achei – o
Poema de Beleza
Das esmeraldas
tristes dos teus olhos.
ESMOLA DE AMOR
Não fui eu. Foste
tu que enclausuraste
No próprio peito o
ardor desta paixão.
Eras feliz. E eu –
trágico contraste –
Um vagabundo da
imaginação.
O bem que te
ofertei nunca encontraste,
E eu nunca dei
alento a esta ilusão.
Mas tive que
partir. E tu ficaste
Amargurada em meio
à solidão.
O pecado de amar
te foi tão rudo
Que sinto, agora,
perpassar por tudo
Teu vulto, a me
seguir por onde eu for.
Hoje sofre demais,
sempre calado:
Não por te amar,
mas por ter sido amado
Sem merecer a
esmola deste amor.
PROSÉLITO
Já que é mister
viver no esquecimento,
Colhendo as
desventuras uma a uma,
A cruz pesada do
meu pensamento
Trago, sem
Cireneu, por entre a bruma.
Por entre as
névoas fortes do tormento,
Sem nunca ser
feliz na terra, em suma,
Hei de passar
silente e sem lamento,
Sem me queixar,
jamais, de coisa alguma.
Serei feliz na dor
e na humildade.
Já que é forçoso
amar esta ansiedade,
Os prantos meus
sufoco-os na garganta.
É que, moldado à
ingratidão da sorte,
Meu pobre coração,
depois da morte,
Soluça, chora,
enxuga o pranto e canta!
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Fonte:
Revista da Academia Sul-Mato-Grossense de Letras: nº 4 - junho de 2004.
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