MONJOLO
Chorado do
Bate-Pilão
Fazenda velha.
Noite e dia
Bate-pilão.
Negro passa a vida
ouvindo
Bate-pilão.
Relógio triste o
da fazenda.
Bate-pilão.
Negro deita. Negro
acorda.
Bate-pilão.
Quebra-se a tarde.
Ave-Maria.
Bate-pilão.
Chega a noite.
Toda a noite
Bate-pilão.
Quando há velório
de negro
Bate-pilão.
Negro levado pra
cova
Bate-pilão.
COCO DE PAGU
Pagu tem os olhos
moles
uns olhos de fazer
doer.
Bate-côco quando
passa.
Coração pega a
bater.
Eh Pagu eh!
Dói porque é bom
de fazer doer.
Passa e me puxa
com os olhos
provocantissimamente.
Mexe-mexe
bamboleia
pra mexer com toda
a gente.
Eli Pagu eh!
Dói porque é bom
de fazer doer.
Toda a gente fica
olhando
o seu corpinho de
vai-e-vem
umbilical e
molengo
de
não-sei-o-que-é-que-tem.
Eh Pagu eh!
Dói porque é bom
de fazer doer.
Quero porque te
quero
Nas formas do
bem-querer.
Querzinho de ficar
junto
que é bom de fazer
doer.
Eh Pagu eh!
Dói porque é bom
de fazer doer.
FAVELA
Meio-dia
O morro coxo
cochila
O sol resvala
devagarzinho pela rua
torcida como uma
costela
Aquela casa de
janelas com dor-de-dente
amarrou um
coqueiro do lado.
Um pé de meia faz
exercícios no arame.
Vizinha da frente
grita no quintal:
-João! Ó João!
Bananeira botou as
tetas do lado de fora
Mamoeiros estão de
papo inchado
Negra acocorou-se
a um canto do terreiro
Pôs as galinhas em
escândalo
Lá embaixo
passa um trem de
subúrbio riscando fumaça
Á porta da venda
negro bocejou como
um túnel.
TAPUIA
As florestas
ergueram braços peludos para esconder-te
A tua carne triste
se desabotoa nos seios
recém-chegados do
fundo das selvas.
Pararam no teu
olhar as noites do Amazonas
mornas e imensas
E no teu corpo
longo.
ficou dormindo a
sombra das cinco estrelas do Cruzeiro.
O mato acorda no
teu sangue
sonhos de tribos
desaparecidas
- filha de raças
anônimas
que se misturam em
grandes adultérios!
E erras sem rumo
assim pelas beiras do rio
que os teus
antepassados te deixaram de herança
O vento desarruma
os teus cabelos soltos
e modela o vestido
na intimidade do teu corpo exato.
À noite o rio te
chama.
Chamam-te vozes do
fundo do mato.
Então entregas à
água
demoradamente
como uma flor
selvagem
ante a curiosidade
das estrelas.
A COISA ÚTIL
Um fruto (ou mesmo
o pão)
é útil à proporção
que alimenta.
A couve-flor (ou
mesmo o ar)
é bela porque
germina.
Assim o trigo e o
canavial,
o café e o porto,
a mulher e o
tempo.
Sementes de gordos
horizontes.
Comei deste poema
um gomo ou a
laranja integral.
O pó não alimenta,
mas na terra o
pasto viceja.
No pensamento
vazio nada vive,
mas onde houver
substância,
ali o alimento
existe.
Mastigai o poema,
com casca, polpa,
germens, ácidos.
Os resíduos
seguirão o doloroso fim.
A seiva
enriquecerá teu plasma sanguíneo:
em ferro e iodo,
em sol e tempo
e horizontes
palpáveis.
Uma fruta (ou
mesmo a harmonia),
o agrião, as
greves e as alfaces,
- palavras
indigestas à poesia…
No entanto, o
nutritivo poema se fermenta
e sobre cidades,
soldado, fábrica, menino,
explica a anemia,
nutre a revolução.
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