ADVERTÊNCIA
Ai daqueles que
brincam com a esperança de um povo!
Ai daqueles que se
banqueteiam junto a fome de seus irmãos!
Ai daqueles que
são fúteis numa hora grave, indiferentes num momento definitivo!
Ai daqueles que
corrompem para tirar proveito da corrupção, que envenenam o mundo pela volúpia
de caminhar impunimente entre ruínas!
Ai daqueles que
fazem da mentira a verdade de suas vidas!
Ai daqueles que
usam os simples como degraus de sua vaidade e instrumentos de sua ambição!
Ai daqueles que
fabricam com a violência a trama do medo!
Ai daqueles que
roubam ao próximo à alegria de existir!
Ai daqueles que
usam dinheiro e o poder para prostituir, humilhar e deformar!
Ai daqueles que se
atordoam para fugir das próprias responsabilidades!
Ai daqueles que
traficam a terra de seus mortos, enxovalham tradições e traem compromissos com
o presente e com o futuro!
Ai daqueles que se
fazem de fracos no instante da tempestade!
Ai daqueles que se
acomodam a tudo, que se resignam a tudo, que se entregam sem lutar!
Ai daqueles que
loteiam seus corações, alugam suas consciências, transacionam com a honra,
especulam com o bem, açambarcam a felicidade alheia e erguem virtudes falsas sobre
pântanos!
Ai daqueles que
concordam em morrer vivos!
PRECE!
Senhor!
- Livrai-nos de um
amor
inexpressivo pela
vida e de um temor
sem nome pela
morte.
- Livrai-nos
do demônio do
tédio,
da tentação do
atordoamento,
dos infernos da
rotina,
do fogo fátuo do
orgulho
ou da tepidez de
falsas humildades.
Livrai-nos
dos avaros de
paixão,
do enxofre da
subserviência,
do purgatório da
indiferença,
do exílio da
ingratidão,
da asfixia de
rótulos e de amarras,
da gangrena de
toda a covardia,
ou do deserto do
desamor.
- Livrai-nos
da tentação de
sermos
superiores ou
inferiores a alguém,
do pântano das
frustrações,
das máscaras dos
vícios,
da fantasia das
virtudes,
das fugas, da
depressão,
da miragem dos
caminhos,
da ferrugem do
ódio,
da atrofia da
força,
do viver sem
vocação.
- Livrai-nos
dessas tentações
ou livrai-nos de
nós mesmos.
Agora e para todo
o sempre
Amém!
SE ME PERDI
Em vícios de
encantação
As realidades
virtuais
Despetalaram
velames
Nas amuradas do
cais.
Foram dias, foram
noites
Onde de mim me
perdi,
Houve luxúria de
opalas
E cilícios de
rubi.
Fui caminhando
esquecido
No bojo de meus
enigmas,
E as ametistas
floriram
Na ramagem dos
estigmas.
Se me perdi foi
apenas
Motivo de me
encontrar,
No vôo de tantas
penas,
Meu silêncio e a
voz do mar.
SONETO I
Venho de longe,
trago o pensamento
Banhado em velhos
sais e maresias;
Arrasto velas
rotas pelo vento
E mastros
carregados de agonia.
Provenho desses
mares esquecidos
Nos roteiros de há
muito abandonados
E trago na retina
diluídos
Os misteriosos
portos não tocados.
Retenho dentro da
alma, preso à quilha
Todo um mar de
sargaços e de vozes,
E ainda procuro no
horizonte a ilha
Onde sonham morrer
os albatrozes...
Venho de longe a
contornar a esmo,
O cabo das
tormentas de mim mesmo.
SONETO XIII
Pastor já fui
desse rebanho alado,
Que pelos céus
caminha, pensativo,
A ruminar a grama
azul do prado
E a desmanchar-se
em pensamento vivo.
Pastor já fui de
olhar perdido e calmo,
Guardando as reses
pelo campo etéreo,
Entoei sobre a
campina cada salmo
De um livro que
perdi sobre o mistério.
Já fui pastor fora
de certo espaço,
Das loucas
dimensões em que me banho,
Não sei se é no
futuro em que me abraço
Ou no passado
desse meu rebanho!
Pastor já fui,
hoje arrebanho a mágoa
Do meu rebanho a
desfazer-se em água.
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