O RECONHECIMENTO
CONTOS ARGELINOS
A organização política do
Al-Patak não é assim tão absoluta como se pode supor.
Em tese o sultão tem todos os poderes,
mas, devido à tradição, à liberalidade de alguns soberanos, o reino possui
tribunais e juízes independentes que decidem soberanamente sobre os assuntos
que lhes são afetos.
Além disto, Al-Patak possui uma
espécie de parlamento – o "divã" — que representa ao rei sobre as
necessidades dos povos. Cada província, conforme a população, dá um certo
número de representantes que o são durante alguns anos, uns durante mais anos e
outros menos.
Logo que Abu-Al-Dhudut usurpou o
trono, tratou de reformar essa espécie de conselho de Estado.
Não há quem não queira fazer
parte dele, não só pelos vencimentos que
percebem os seus membros, como também pelos presentes que recebem, graças à influência
que possuem, podendo obter dos soberanos tudo o que desejam.
O príncipe irmão de Abu-Al-Dhudut
foi logo eleito membro do "divã" e feito chefe dele.
Sendo homem esperto e sagaz,
conhecendo perfeitamente os desejos de todos os habitantes de Al-Patak de serem
do famoso conselho, tratou de regular a entrada nele, ao jeito mais propicio
aos seus interesses.
Com este, negociava isto; com
aquele, barganhava aquilo.
Ia fazendo o seu negócio, quando
se tratou do reconhecimento de cide Pen Ben-Forte. Tinha sido, esse ulemá, juiz
durante muito tempo, de forma que conhecia o irmão do sultão, quando advogava.
O seu direito à entrada no
"divã" era inconcusso, mas o príncipe queria que ele lhe desse dez
mil piastras para tornar efetivo o seu direito.
Pen Ben-Forte não esteve pelos
autos e lembrou a sua Alteza o fato de ter ele obtido, revelando uma sentença
dele, cide, dinheiro ao mercador — sentença mais tarde reformada.
Pen Ben-Forte tinha disso
documentos e prometeu publicá-los, se não entrasse no “divã".
Não é preciso contar mais; basta
dizer que o antigo juiz entrou e foi reconhecido membro do conselho.
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Nota:
Lima Barreto: "Histórias e Sonhos" (1920)
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