O JURAMENTO
CONTOS ARGELINOS
Logo que Abu-Al-Dhudut se apossou
do trono de AI-Patak, todos os seus companheiros e amigos quiseram também fazer
o mesmo nos remos vassalos, embora muitos dos soberanos destes tivessem ajudado
Abu na sua usurpação.
O primeiro agha (ministro da
Guerra) ansiava por ocupar o governo do canato de Al-Súgar, região rica e
vasta, que até ali era governada pelo cã Ross Al-Xeiroso.
Este príncipe não se incomodava
muito com a administração dos seus domínios e vivia em passeios e festas, fora
da sua capital.
Poderoso e rico, tinha ajudado
muito Abu-Al-Dhudut a subir no trono de Al-Patak, de forma que todos supunham
que as pretensões do agha não seriam favorecidas
pelo novo sultão.
O agha, porém, não se incomodou com os serviços que Ross Al-Xeiroso
tinha prestado a seu amo e senhora e tratou de encher o canato de Al-Súgar de
spabis, bombardeiros e outras tropas irregulares, sob o pretexto de que as
tribos do deserto ameaçavam a capital do canato e Ross AI-Xeiroso nada fazia,
deixando-se ficar entregue aos prazeres e folguedos.
Este príncipe, vendo que o agha
continuava nos seus propósitos deusurpação, pediu uma audiência a
Abu-Al-Dhudut, no que foi imediatamente atendido.
Recebeu-o Abu no divã do casbah (palácio imperial) e fez todas as
promessas ao príncipe vassalo:
— Ross AI-Xeiroso, juro pelos
santos livros, pelo Corão, que prefiro pôr termo aos meus dias do que te ver
fora do governo de Al-Súgar.
Ross Al-Xeiroso saiu seguro de
que continuaria no governo e que seu filho herdaria a sua coroa de príncipe,
mantendo a sua descendência nela.
Em breves dias, porém, soube que agha tinha mandado mais tropas para os seus
domínios.
Correu de novo a Abu-Al-Dhudut,
que lhe reiterou as promessas feitas.
Ross AI-Xeiroso voltou a
divertir-se alguns dias, quando teve notícias que o agha, à frente das tropas que para lá tinha enviado, tomara conta
do governo de Al-Súgar e, como cã, fora reconhecido por todos, inclusive por
Abu-Al-Dhudut.
Esperou ainda alguns dias a ver
se o sultão se matava; ele, porém, continuou a viver a melhor das saúdes.
Ross Al-Xeiroso, contudo, espera
até hoje que Abu-Al-Dhudut cumpra a sua palavra santa de sultão e chefe dos
crentes.
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Nota:
Lima Barreto: "Histórias e Sonhos" (1920)
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