CAPRICHOSA!
— Quero que o mar te leve
numa onda azul de rosas dizia ela, abrindo o regaço azul cheio daquelas rosas
de amor; voltarás amanhã ao alvorecer, e a brisa do mar trar-me-á o teu batel
por sobre estas flores ainda frescas.
— Mas... não vês, Ilza, no
horizonte, aquele negror que se estende como um véu de crepe? É a bandeira da
tempestade que se arvora no campo sidéreo... é o vulcão que ameaça revoltar os
mares... e deixas-me partir, sozinho, pela noite que vem?!...
— Tu, Aldino, pescador de
corais, temes? Tu, nadador sem rival receias?... Não! Se a tempestade bramir,
olha o farol daquele promontório; singra depressa para ali. Antes que o sol
venha amanhã dourar aqueles outeiros verdes, tu adornarás meus cabelos negros
com o ramo de corais prometido como presente de noivado...
— Um beijo, um abraço, e...
adeus!
Lá no marulho da onda mansa
envolveu-se o sussurro de um beijo, e no suave anhelito da viração marinha
perdeu-se o arquejo de um suspiro de amor. E a onda de rosas levou o pequeno
batel de Aldino.
Alta noite, Ilza gemia sob
a pressão de um pesadelo horrível...
Era como se rijos braços a
cerrassem mais e mais...
Aldino! Aldino! murmurou,
aflita, num suspiro longo que a despertou.
Ergue-se, entreabre o
postigo; espreita o mar...
O céu negro e pesado; a lua
rompe a custo espessa nuvem sombria e para logo se envolve pálida naquele véu
de luto, como jovem recém-viúva surpreendida demuda a face linda...
De repente, o tufão
violento espalhou-se nos ares; o mar em vagas alterosas sacode brava a espuma
alvíssima sobre os fraguedos da costa. Salsos respingos trazidos pelas refregas
vêm borrifar as faces de Ilza, que se debruçava na escuridão, e aquelas gotas
salinas que lhe caem no seio têm o sabor das lágrimas de uma dor crudelíssima...
Quando o alvor da manhã
aclarava o Céu, na praia, pendida sobre a orla espumante do mar, Ilza
desvairada estende os braços a onda que gemia, coberta de rosas,
apresentando-lhes o corpo inanimado do seu desditoso Aldino!
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Nota:
Delminda Silveira: "Lises e Martírios" (1908)
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