AS ROSAS
DA CARIDADE
É bem conhecida a lenda do
milagre das rosas de Santa Izabel, mas tão linda, tão comovedora é, que não
posso furtar-me ao desejo de intercalar entre os meus singelos Contos de um
instante , a interessante narrativa desse episódio em que, num momento, a
Providência Divina transformou em perfumadas rosas os socorros piedosos da
caridade bendita.
Izabel, a formosa e
compassiva rainha da Hungria, era o anjo consolador dos pobres vassalos desde
os arredores do seu Castelo a muitas léguas distante.
Um belo dia, caminhava a
piedosa soberana, acompanhada unicamente de sua fiel donzela, por um dos mais
escuros carreiros do campo, levando no regaço do manto, pão, ovos e outros
comestíveis mais, destinados aos seus pobres, quando, em uma volta do caminho,
encontra-se face a face com o severo esposo que voltava da caça pelos montes.
Surpreendido este de vê-la
assim curvada caminhando, como se a custo levasse pesada carga, estende a mão
ao regaço que ela atemorizada conchegava ao seio, dizendo: - que levais aí,
Senhora?
— São rosas... responde-lhe
timidamente a Santa.
— Vejamos essas rosas
tornou ele, com irônico sorriso, pois que era passada a estação das flores e
nem pelos campos, nem nos seus magníficos jardins se via desabrochar rosa
alguma, - e desprendendo com violência o regaço que a caridosa mão colhia, só
de rosas brancas e purpurinas viu cobrir-se o solo sobre o qual Izabel caiu de
joelhos no meio da mais primorosa alcatifa!
Atônito, quis então o
desumano Senhor reanimar a Esposa com suas carícias, porém deteve-se
deslumbrado pela aparição da imagem luminosa de um crucifixo que, pairando por
sobre a cabeça de Izabel, a envolvia no suavíssimo clarão de uma Benção
divina...
O arrependimento, os
remorsos pungiram o coração antes insensível, do soberbo Landgrave que,
prostando-se com recolhimento verdadeiro, levantou uma daquelas maravilhosas
flores, guardando-a por memória do glorioso sucesso com que Deus quisera
rasgar-lhe a venda que aos olhos da alma ocultava as misérias humanas, bem como
os inefáveis encantos da Caridade divina. Agora, humilde, pedia à Esposa que
continuasse sua piedosa jornada, sem o menor receio, e de volta ao castelo, meditava
no poder do Amor de Deus.
Por eterna memória deste
milagre da Caridade, ao lado de um antigo carvalho cuja sombra tivera lugar tão
providencial encontro, ele mandou levantar uma suntuosa coluna encimada por uma
formosa Cruz grata lembrança daquela que resplandecente mais que a coroa da
realeza, viria fulgir sobre a imaculada fronte da bem-aventurada Izabel.
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Nota:
Delminda Silveira: "Lises e Martírios" (1908)
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