INFIDELIDADE
Há sete
anos que ela trabalha como recepcionista numa agência de automóvel. Entrava às
oito da manhã e saía sempre às cinco da tarde. Do trabalho ia diretamente para
casa e, de tal modo, que este hábito se transformou para ele numa espécie de
garantia de fidelidade. Daí a ideia fixa com a qual julgava agora a companheira
como despudorada e traidora.
Tentou
conjecturar outras hipóteses. Talvez a mulher tivesse razão quando disse que
simplesmente tinha ido ao Shopping comprar uma coisa. Logo, porém, indagava a
si mesmo se ela não poderia ter feito isso num outro dia, no sábado ou domingo,
ou então, já que quisesse ir durante a semana, que o avisasse antecipadamente.
Ora, custava fazer isso?
Mentalmente
via-se andando na rua enquanto pessoas sentadas nas calçadas riam dele com
malícia e faziam comentários zombeteiros a seu respeito.
Com o
decorrer dos dias, a ideia de infidelidade o dominou completamente,
convertendo-se numa verdadeira obsessão. Do deitar ao levantar só pensava
nisso. No trabalho desconcentrava-se dos seus deveres e se punha a imaginar mil
situações envolvendo a esposa e seu suposto amásio.
Ao
pressentimento de traição, seguiu-se o sentimento de culpa, que o
martirizava. Aventava a ideia de que
poderia ter falhado no seu papel de marido. Deveria ter sido mais carinhoso e
prestativo com a mulher. Lembrou-se de que já não mais a elogiava, posto que no
início do casamento não se cansava de ressaltar sua beleza e de chamá-la
"minha linda" etc. De uns tempos para cá, acostumara com a rotina de
casado, e de tal maneira que se esquecera de exaltar suas qualidades, sua
roupa, seu corte de cabelo, sua comida, enfim, nem sequer a beijava como antes!
A culpa,
entretanto, aos poucos se esvaía de sua mente perturbada, que agora se ocupava
apenas em encontrar um jeito de se vingar de tamanho ultraje. A primeira ideia
era ir ter com ela e obrigá-la a confessar sua sem-vergonhice, dizer-lhe os
piores desaforos e expulsá-la de casa. Enquanto maquinava tais pensamentos,
fora tomado por outra súbita e iluminada ideia, que lhe parecia ainda mais doce
para rematar sua vingança.
Era
sexta-feira. Acabava de sair do trabalho. Nesta circunstância era hábito ir
diretamente para casa, onde encontrava a mulher ao pé da pia ou aprontando o
jantar. Neste dia, porém, tomou o ônibus e dirigiu-se ao famoso "Bar
32", onde pretendia consumar seu duplo desejo. Este local era afamado na
região pela abundância das meretrizes. Dizia-se que até mulheres casadas
ofereciam por lá seus préstimos serviços.
Enquanto
isso, em casa, a mulher que acabava de aprontar o jantar, desembrulhava, entre
soluços e lágrimas, o presente que havia comprado no Shopping para ele. Era
para comemorar os dez anos de casados.
São Paulo, 2016
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